Investigados mentiram para proteger Bolsonaro em caso das joias, diz PF
A PF (Polícia Federal) afirmou que investigados no inquérito das joias prestaram informações falsas em depoimentos ao órgão com o objetivo de proteger o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), tentar ludibriar as autoridades e ocultar os atos ilícitos atribuídos ao grupo.
A estratégia, segundo a polícia, teria sido orquestrada entre Osmar Crivelatti, assessor vinculado à segurança do ex-presidente, hoje afastado de suas funções por determinação judicial, e Marcelo Câmara, assessor especial do ex-presidente da República.
Depoimentos anteriores de ambos, de acordo com o órgão, trouxeram informações erradas sobre a localização, movimentação e destino das joias desviadas do acervo público, os chamados kits ouro branco e rosé.
Os investigados disseram, em depoimentos, que o material estaria na fazenda do ex-piloto de Fórmula 1 Nelson Piquet, em Brasília, junto com os demais itens do acervo privado de Bolsonaro.
Dessa forma, segundo a PF, eles poderiam trazer as joias do exterior de forma oculta, simulando uma entrega a partir da fazenda após determinação do TCU (Tribunal de Contas da União) para reaver os bens.
“Evidencia-se, claramente, que os investigados combinaram as versões a serem apresentadas às autoridades policiais, com o objetivo de tentar ocultar os atos ilícitos praticados, no caso o envio das joias ao exterior para serem negociadas e seus proventos serem revertidos, ilicitamente, ao patrimônio do ex-presidente”, disse a PF.
Câmara, segundo a PF, disse em depoimento que foi o responsável por receber todo o acervo privado do ex-presidente, em abril de 2023, e teria dito, “com o objetivo de embaraçar as investigações”, que o material havia sido encaminhado à fazenda.
De acordo com o relatório, o ex-assessor também declarou não saber se, antes do armazenamento na fazenda de Piquet, as joias estavam sob a responsabilidade do ex-presidente e afirmou ter certeza de que elas saíram da propriedade.
A PF disse que Câmara deu mais detalhes falsos ao afirmar que um dos kits de joias, o rosé, havia sido retirado do armazenamento por Crivelatti e entregue ao advogado de Bolsonaro para posterior envio ao TCU.
Ele também afirmou, com o objetivo de proteger os atos ilícitos praticados pelo ex-presidente, segundo a PF, que as joias não tinham sido levadas aos EUA e que ele próprio estava com Bolsonaro na época.
“Por fim, Marcelo Câmara, reiterando seu objetivo de obstruir as investigações, ainda afirmou: após a divulgação dos fatos na mídia, nega que tenha sido procurado por qualquer das pessoas envolvidas direta ou indiretamente na situação, que ninguém o solicitou para dizer ou omitir algo”, disse a PF.
A polícia disse que Crivelatti também prestou informações falsas sobre a localização das joias desviadas do acervo público em depoimento prestado em abril de 2023, seguindo a mesma estratégia articulada pelo grupo.
Ele afirmou que os presentes que estavam no gabinete presidencial e no Palácio do Alvorada tinham sido encaminhados para a fazenda e que, a pedido de Câmara, havia retirado uma caixa de joias do local e a entregue ao advogado do ex-presidente para que fossem devolvidas ao TCU.
Após a deflagração de nova fase da investigação, Crivelatti foi novamente ouvido, em agosto de 2023, e admitiu que havia prestado informações falsas na condição de testemunha em abril daquele ano.
Nesta ocasião, o militar disse que não retirou o kit ouro rosé na fazenda e que, na verdade, buscou o advogado do ex-presidente no aeroporto de Brasília em março de 2023 e que ele já estava na posse dos bens.
Isto confirmaria a apuração da PF de que as joias do kit ouro rosé estavam guardadas na cidade de São Paulo e tinham sido levadas a Brasília pelo advogado de Bolsonaro, em março de 2023.
“Crivelatti admitiu ainda que tinha conhecimento de que as joias do kit ouro rosé haviam sido enviadas para o exterior, confirmando que prestou informações falsas no depoimento anterior”, diz o documento.
Em março deste ano, ele prestou um novo depoimento confirmando que Bolsonaro “tinha plena ciência” de que o kit ouro rosé estava nos Estados Unidos e que, ao retornar de viagem com o ex-presidente da cidade de Washington, entregou o conjunto a ele.
Ao ser questionado sobre o motivo de ter mentido no depoimento, ele afirmou que tinha ciência de que o coronel Câmara, em declarações anteriores à Polícia Federal, tinha afirmado falsamente que o kit em ouro rosé estaria na fazenda Piquet e, diante disso, “procurou manter a mesma versão, mesmo ciente da falsidade das afirmações”.
O advogado de Crivelatti chegou a dizer , neste depoimento, que seu cliente, quando prestou informações falsas em depoimento à PF, não recebeu defesa técnica adequada e que estava assistido por uma advogada designada pela equipe de defesa do ex-presidente.
O conjunto de joias rosé é composto por itens masculinos da marca Chopard, com uma caneta, um anel, um par de abotoaduras, um rosário árabe e um relógio recebidos pelo então ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, após viagem a Arábia Saudita, em outubro de 2021.
A análise dos dados coletados pela PF no celular do ex-ajudante de ordens de Bolsonaro Mauro Cid revelou que o kit foi levado do país, em dezembro de 2022, por meio do avião da presidência da República, e submetido à venda em leilão nos Estados Unidos.
Já o kit ouro branco é composto por um relógio Rolex, caneta da marca Chopard, par de abotoaduras, anel e rosário árabe. O pacote teria sido recebido, segundo a PF, em uma viagem oficial a Doha, no Catar, e em Riade, na Arábia Saudita, em outubro de 2019.