Assassinato de candidato à Presidência do Equador pode causar reviravolta em eleições, diz analista
Por Mateus Cerqueira
O assassinato do candidato à eleição presidencial do Equador, Fernando Villavicencio, da aliança política Construir, tornou ainda mais difícil a leitura do cenário eleitoral do país. O crime mudou o cenário político, tornou descartável os resultados das últimas pesquisas de intenção de votos realizadas anteriormente e pode gerar uma reviravolta no 1° turno, previsto para o próximo dia 20.
“No momento, não é claro que algum dos candidatos mais bem colocados nas pesquisas de intenção de votos captem os eleitores de Villacencio e tenham probabilidade claras de vencer já no primeiro turno”, aponta a analista de risco para o Equador, Laura Lizarazo, da Control Risks. “Outro fator é que o candidato que substituirá Villavicencio ainda não foi nomeado”.
O candidato estava em segundo lugar em uma das principais pesquisas de intenção de votos e era conhecido por fazer oposição ao ex-presidente Rafael Correa, atualmente asilado na Bélgica, e captava votos sobretudo entre os detratores do Correísmo.
“A aliança de Villavicencio terá, obrigatoriamente, que nomear um candidato, o que pode gerar uma reviravolta nas eleições, contrariando as pesquisas que apontam González [candidata do Correísmo] como líder nas intenções de votos”, diz.
A leitura da analista é que se antes havia falta de informação sobre os candidatos, suas propostas e, até mesmo, sobre as datas das eleições, hoje não há mais. A expectativa é que, com a cobertura massiva do assassinato de Villavicencio, os equatorianos compareçam em peso à votação, como uma clara resposta à onda de violência que vive o país.
Conforme revelou Lizarazo, cerca de 65% dos cidadãos sequer sabiam quando seria realizado o primeiro turno das eleições, e seguiam indecisos.
“É uma situação de reversão de cenário, o que pode fazer com que a população – preocupada com os altos números de desemprego, informalidade e violência – compareçam em peso na votação, já com um candidato em mente”, explica.
Para ser eleito(a) já no primeiro turno, o candidato ou a candidata à Presidência precisa de mais 50% de todos os votos válidos no primeiro turno, ou 40% dos votos válidos com uma diferença de 10% em relação ao segundo mais bem colocado na corrida presidencial. Caso ocorra um 2° turno (15 de Outubro), vence as eleições o candidato que obtiver mais votos (maioria simples).
Quem são os candidatos mais bem colocados nas pesquisas?
As últimas pesquisas apontavam Fernando Villavicencio entre os quatro mais bem colocados, ao lado de Luisa González (Revolução Cidadã e candidata do Correísmo), Otto Sonnenholzner pela aliança Vamos Agir e Yaku Pérez, pela coligação Claro que é Possível.
Em 20 de julho, a Cedatos, empresa de pesquisa aprovada pelo Conselho Nacional Eleitoral (CNE) do Equador, apontou que a candidata do Correísmo continuava a liderar as pesquisas de intenção de votos, com 26,6%, seguida por Villavicencio (13,2%), Pérez (12,5%) e Sonnenholzner (7,5%).
Na mesma pesquisa, disseram que votariam nulo 16,1% dos entrevistados, não souberam ou não quiseram responder 7,6% dos entrevistados e votariam em branco 2,6%. A pesquisa foi realizada com 1.300 pessoas em 34 localidades desde urbanas, rurais, de serra, costeira e amazônica. Atualmente, o Equador tem uma população estimada em 17,8 milhões de pessoas.
No entanto, em uma pesquisa realizada pelo Centro de Estratégico Latinoamericano de Geopolítica (Celag), Villavicencio estava na quarta posição, após a média de três pesquisas apontar que ele tinha 8% das intenções de votos, enquanto González seguia na liderança, com média de 30% da intenção de votos, seguida por Sonnenholzner (13%), segunda posição, e Pérez (11%), terceira posição.
Corrida aos eleitores
Os números, conforme explicou o professor do Instituto de Altos Estudos Nacionais (IAEN) do Equador e cientista político, Diego Pérez Enríquez, eram uma mostra do quão indecisos e desesperançosos seguiam os eleitores equatorianos com a política do país, sobretudo, após o período de Rafael Correa na presidência, de 2007 até 2017.
“Não podemos nos esquecer que Correa teve a seu favor um bom momento, com o preço do barril do petróleo elevado, uma boa relação com o legislativo, com 100 aliados dos 137 deputados na câmara”, diz o cientista político, ao acrescentar que os governos do ex-presidente Lenín Moreno e do atual mandatário, Guillermo Lasso, são similares no que concerne a um estado com pouca capacidade de gestão e com alto nível de endividamento público.
Outro desafio determinante que se coloca diante dos candidatos à presidência e, especialmente, à Luisa González, é a profunda divisão existente no país entre os detratores de Rafael Correa e aqueles que o apoiam (comportamento muito similar à polarização em torno da imagem do presidente Lula, no Brasil). Com o assassinato de Villavicencio, há dúvidas sobre como se comportarão os eleitores, especialmente, os detratores de Correa.
Enríquez relembra que a leitura era que esse grupo votaria no candidato que tivesse mais chances de evitar a volta do Correísmo, atualmente encabeçado por González. “A prova disso foi a vitória de Lasso que foi eleito em torno da sua imagem pessoal, sem uma plataforma tradicional de eleitores e sem uma longa carreira política, com o intuito de impedir o regresso do Correísmo”.
O atual mandatário não está participando dessas eleições e ainda não declarou apoio a nenhum candidato.
Por que novas eleições foram convocadas?
Atualmente, o país ao oeste da América do Sul vive um processo político turbulento, somado a uma crise econômica e onda de violência, agravadas após o presidente em exercício, Guillermo Lasso (Movimento Acredito), decretar a dissolução da Assembleia Nacional e, assim, antecipar as eleições para o Legislativo e Executivo do país.
O dispositivo é previsto no artigo 148° da constituição equatoriana e denominado por especialistas como “morte cruzada”, já que tanto os deputados federais e o presidente perdem os seus cargos, com a diferença que os parlamentares perdem o posto imediatamente, enquanto o chefe do executivo se mantém no poder, governando por decretos leis até a realização de novas eleições.
Entretanto, apesar de previsto em lei, o uso do mecanismo gerou polêmica entre os equatorianos, uma vez que o ex-banqueiro e conservador enfrenta acusações de corrupção e, no congresso do país, já aconteciam reuniões sobre um possível pedido de impeachment do presidente.
Após as eleições desse 20 de agosto, espera-se que o presidente e deputados eleitos tomem posse em novembro deste ano, com a diferença que o chefe do executivo assume o cargo no dia 30 de novembro e os deputados, 20 dias antes, caso o processo siga normalmente. Ambos se mantêm no poder até maio de 2025, ano no qual são realizadas novas eleições.
Quem é Fernando Villavicencio
Nascido em 11 de outubro de 1963, em Alausí, Fernando Alcibiades Villavicencio Valencia teve uma intensa trajetória como jornalista e sindicalista ao mesmo tempo em que abraçava a carreira política.
Estudou jornalismo e comunicação na Universidade Cooperativa da Colômbia, na qual se formou e iniciou seus trabalhos como comunicador social. Logo em seguida, iniciou na carreira política como um dos fundadores do Partido Pachakutik, em 1995.
No ano seguinte, começou a trabalhar na Petroecuador, a companhia petrolífera estatal do país. Lá, atuou com jornalismo e logo assumiu posições sindicais. Ele se manteve como um líder dos trabalhadores da companha até 1999, quando foi demitido por uma ordem do então presidente Jamil Mahuad.
Mesmo longe da Petroecuador, continuou denunciando os problemas da companhia, como delitos ambientais e trabalhistas. Ganhou notoriedade como um dos mais ferrenhos críticos do então presidente Rafael Correa.
Em 2017, concorreu e foi eleito a uma vaga na Assembleia Nacional. Ocupou o cargo até maio deste ano, quando o presidente Guillermo Lasso assinou a “morte cruzada”, que resultou na dissolução do parlamento equatoriano.
Crítico do correísmo e do governo Lasso, Villavicencio foi um dos personagens mais visíveis nas denúncias de corrupção nos setores de petróleo, energia, telecomunicações e estruturas criminosas, segundo seu perfil na Assembleia Nacional do Equador.
(Com informações da Reuters)