Paulo Guedes é o ministro da Economia no governo Bolsonaro. Foto: MARCOS CORRÊA/ PR

Por Daniel Pereira

Com apenas três meses no cargo, Paulo Guedes ameaçou deixar o governo se Jair Bolsonaro e a base aliada no Congresso não defendessem os pontos principais de sua agenda: reformas estruturantes, privatizações e compromisso com o teto de gastos. “Se o presidente apoiar as coisas que eu acho que podem resolver para o Brasil, eu estarei aqui. Agora, se ou o presidente ou a Câmara ou ninguém quer aquilo, eu vou obstaculizar o trabalho dos senhores? De forma alguma. Voltarei para onde eu sempre estive”, declarou o ministro da Economia, em março de 2019, numa sessão da Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado. “Eu venho para ajudar. Acho que tenho ideias interessantes. Aí o presidente não quer, o Congresso não quer, vocês acham que eu vou brigar para ficar aqui? Se ninguém quiser o serviço, vai ser um prazer ter tentado”, acrescentou.

Naquela época, Guedes ainda circulava por Brasília com o status de superministro. Acreditando nessa fantasia, chegou a recomendar uma “prensa” nos parlamentares para garantir a votação da reforma da Previdência. O texto acabou aprovado — não por causa da pressão dele ou da articulação política do governo, mas, principalmente, devido à atuação de algumas lideranças do Congresso, mais comprometidas com a agenda liberal do que o próprio presidente da República. Foi a maior conquista do chefe da equipe econômica na seara legislativa. Desde então, o ministro — mesmo comemorando a aprovação de outros projetos, como a autonomia do Banco Central e a MP da Eletrobras — passou a perder embates para o núcleo político da gestão Bolsonaro e os parlamentares em geral. De forma gradativa, seu propalado prestígio foi dando lugar à perda de relevância na tomada de decisões para o destino da economia e das contas públicas. Os principais responsáveis por isso foram o presidente e o Centrão.

Bolsonaro nunca foi um entusiasta da agenda liberal, que adotou na campanha de 2018 para fazer contraponto ao PT. De olho na reeleição, o presidente sabotou até aqui a reforma administrativa, por medo de perder votos entre servidores públicos, e jamais se empenhou de fato pelas privatizações. De quebra, ainda ameaça intervir em empresas como a Petrobras a fim de segurar preços e distribuir bondades. Com a adesão do Centrão à base governista, o componente eleitoral passou a pesar ainda mais nas decisões econômicas. No início da pandemia, foi uma articulação entre esse grupo e a oposição que fixou o valor do auxílio emergencial em 600 reais, ante uma proposta inicial de 200 reais da equipe de Guedes.

Agora, com o governo Bolsonaro batendo recorde de rejeição, é o Centrão que comanda a ofensiva para que o valor do Auxílio Brasil, o novo programa de transferência de renda do governo, seja de 400 reais, mesmo que para isso o teto de gastos tenha de ser desrespeitado. O Guedes de 2019, aquele que falou ao Senado, talvez pedisse demissão diante de tal ideia. Já o Guedes de agora capitulou. Ele não só admitiu a possibilidade de furar o teto nuns 30 bilhões de reais como apareceu ao lado de Bolsonaro para dizer publicamente que “não adianta tirar 10 no fiscal e zero no social”. “Fui mal interpretado, o que precisamos é de uma licença para gastar um pouco mais, não acabar com o fiscal”.

O Auxílio Brasil não acabaria com o fiscal se outras medidas fossem adotadas. Por exemplo: se Guedes tivesse convencido o presidente a cortar recursos que hoje são controlados pelos políticos, como as controversas emendas de relator, da ordem de 20 bilhões de reais. O ministro não teve força para comprar essa briga. Os detalhes da pressão sobre ele foram contados há duas semanas numa reportagem de Veja. Guedes continua no cargo apesar de o presidente e o Congresso darem cada vez menos importância às ideias que ele defende.

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