Briga por templos da Universal em Angola causa conflitos com a polícia

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Cerca de 100 templos da Igreja Universal em Angola foram interditados por autoridades do país devido à batalha judicial envolvendo a igreja. © Getty Images

A disputa entre duas alas da Igreja Universal do Reino de Deus em Angola tem provocado confrontos entre fiéis e a polícia local.

A igreja liderada pelo bispo brasileiro Edir Macedo passa por uma tormenta no país africano há dois anos e meio.

Fiéis pró-Macedo, que rivalizam com lideranças religiosas locais, se mantiveram em vigília durante 24 horas por mais de uma semana em protesto contra a decisão do Estado angolano de manter os templos fechados devido a brigas e processos contra a Universal na Justiça.

Os fiéis, entre eles mulheres idosas, passaram a noite em frente aos templos. Religiosos foram detidos e quatro pessoas ficaram feridas na madrugada da quarta-feira (20/04), quando a Polícia Nacional Angolana tentou retirar fiéis favoráveis a Macedo que ocupavam a catedral do Maculusso, em Luanda.

Cerca de 100 templos da Universal em Angola foram interditados por autoridades do país devido à batalha judicial travada entre os dois grupos que reivindicam o controle da instituição.

A polícia angolana informou que fiéis, “em desobediência às autoridades”, teriam retirado ilegalmente os selos de vedação de acesso aos templos do Maculusso e do bairro do Alvalade. Também teriam sido abertos ilegalmente templos nas localidades de Benfica e Talatona.

“Os pastores têm partilhado áudios nas redes sociais, motivando os fiéis a deslocarem-se nesses templos para praticarem a violência com objetivo de retornar os cultos”, disse o diretor de Comunicação Institucional da Polícia Nacional em Luanda, Nestor Goubel.

A polícia disse que religiosos reabriram os templos sem qualquer mandado que legitimasse a retomada dos imóveis apreendidos. A ala brasileira teria decidido retomar as igrejas por conta própria e, por isso, a polícia foi chamada. Aí houve o confronto.

Nas redes sociais, religiosos ligados à Reforma – grupo de bispos e pastores angolanos reconhecido pelo governo como responsável hoje pela Universal local -, denunciaram que um pastor ligado à ala brasileira teria convocados os fiéis, orientando-os a levarem gasolina e pneus para queimarem em frente aos templos.

O racha na Universal de Angola começou no final de 2019 com o surgimento de grupo que se opôs abertamente à direção brasileira
O racha na Universal de Angola começou no final de 2019 com o surgimento de grupo que se opôs abertamente à direção brasileira

De acordo com o porta-voz da polícia, medidas “severas” poderão ser tomadas contra os seguidores que insistirem em ter acesso aos templos religiosos, sem a prévia autorização legal das autoridades.

Na disputa em Angola, estão os fiéis apoiadores da “Reforma” – que têm o reconhecimento do Instituto Nacional do Diálogo Religioso (Inar), órgão do Ministério da Cultura angolano -, e do outro o “movimento dos 7000”, que segue a liderança de Edir Macedo e continua se considerando a legítima direção da igreja no país.

Disputa pela posse

O racha na Universal de Angola começou no final de 2019 com o surgimento da Reforma, grupo liderado por cerca de 300 bispos e pastores angolanos, que se opôs abertamente à direção brasileira e divulgou um manifesto acusando a instituição por crimes como lavagem de dinheiro, evasão de divisas, racismo e imposição de vasectomia a pastores.

Em junho de 2020, os bispos e pastores angolanos tomaram o comando da igreja, após uma assembleia-geral que destituiu os antigos dirigentes alinhados ao bispo Macedo.

De lá para cá, a disputa se acirrou. Em maio do ano passado, a TV Record África teve suas atividades suspensas em Angola. Mais de 50 pastores e obreiros da Universal foram mandados de volta ao Brasil.

A nova confusão se deu após o juiz Tutri Antônio, da 4ª. Seção de Crimes Comuns do Tribunal de Luanda, determinar, no dia 31 de março, que os templos, o patrimônio e as contas bancárias bloqueadas da Igreja Universal deveriam ser devolvidos à sua legítima direção.

Como o juiz não especificou qual seria essa legítima direção, e há uma disputa ferrenha entre duas alas, a direção brasileira da Universal passou a considerar que teria de volta os seus templos. Em uma nota, a Universal no Brasil afirmou que o tribunal determinou a “devolução dos templos e bens à Universal do país”.

O juiz Tutri Antônio determinou a devolução dos templos ao fim do julgamento que condenou o bispo brasileiro Honorilton Gonçalves, ex-todo poderoso da TV Record no Brasil e depois líder espiritual da Universal em Angola, a três anos de prisão por imposição de vasectomia a pastores. Sua pena foi suspensa por dois anos. Outros três réus ligados à igreja foram inocentados.

Sobre a disputa pelos templos, o magistrado afirmou que a discussão deveria ocorrer numa outra instância judicial, pois cabia a ele apenas a análise de supostos crimes apontados no processo.

“É uma questão que deve ser resolvida em outro tribunal. As pessoas que estão a disputar o controle da igreja têm advogados e sabem onde devem se dirigir para poder determinar com quem vai ficar a gestão e quem vai receber de volta os bens que o tribunal mandou restituir”, disse o juiz. “Essa parte já não me compete, já não compete aos meus colegas. Por esta razão, não nos pronunciamos”.

Para a ala angolana da Universal, não há dúvidas de que a instituição no país é comandada pelo bispo angolano Valente Bezerra Luís, pois a assembleia-geral que o elegeu, em 2020, teria sido reconhecida pelo Instituto Nacional de Diálogo Religioso.

O bispo Edir Macedo, líder da Igreja Universal
O bispo Edir Macedo, líder da Igreja Universal

Porém, uma publicação de alterações no estatuto da igreja no Diário da República (o Diário Oficial angolano), em outubro de 2021, encaminhada pela ala brasileira, reacendeu a discussão e gerou confusão. O governo angolano alega não ter recebido esse pedido de alteração.

O diretor-geral adjunto do Inar, Ambrósio Micolo, disse que hoje já não existem alas na Igreja Universal, mas sim uma direção reconhecida e não teria sido ela a reabrir os templos ilegalmente. “Existe uma direção legitimada pelo governo angolano e que vai receber os templos a serem entregues pelo Inar. O Inar apenas aguarda a notificação do tribunal”, informou. “Os fiéis devem manter a calma, que será reposta a legalidade”.

Em um vídeo nas redes sociais, o bispo Alberto Segunda, o líder da igreja de acordo com a ala brasileira, disse que seus seguidores estão sendo “injustiçados e perseguidos”.

Em nota divulgada na sexta-feira (22/04), o bispo Segunda afirma ainda que a igreja não tem qualquer relação com incitação de atos de violência, seja “direta ou indiretamente”.

A nota prossegue afirmando que há uma “perseguição feroz por um grupo de indivíduos que buscam a qualquer custo atingir seus objetivos escusos”, mas que “nunca iremos compactuar com qualquer ato de resistência violenta”.

A BBC News Brasil entrou em contato com a IURD no Brasil para mais esclarecimentos, mas não recebeu resposta até o momento da publicação desta reportagem.

Segunda já prevê a possibilidade de um resultado desfavorável à ala brasileira. O bispo afirmou que, caso o Estado angolano decida “tirar” o patrimônio da igreja de Edir Macedo, “nós começaremos novamente do zero”. O bispo pediu que, nesse caso, o governo ao menos não retire a marca IURD (Igreja Universal do Reino de Deus).

Um outro porta-voz do grupo pró-Macedo, Olívio Alberto, disse que os “dissidentes da Igreja Universal” teriam tido o apoio da Polícia Nacional Angolana. Para ele, policiais estariam ocupando as igrejas para depois “entregarem aos supostos pastores protegidos pelas autoridades angolanas”. O Inar, na avaliação de Olívio Alberto, também estaria apoiando os bispos e pastores da Reforma.

Os religiosos que se opõem a Edir Macedo, em contrapartida, apoiaram a ação policial na catedral do Maculusso. O bispo Valente Bezerra Luís, apontado pelo Inar como o atual presidente da igreja, a operação policial garantiu a legalidade.

“Tenho de parabenizar o trabalho da polícia. Nossos irmãos invadiram os templos que estavam selados e fizeram os cultos. Foram advertidos que não eram os legítimos representantes e ignoraram o apelo da polícia por três vezes. Em áudios, pastores incentivaram a violência É muito triste”, afirmou Luís.

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