Corte de direitos humanos condena o Estado brasileiro pelo assassinato de trabalhador rural da Paraíba
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Sessão de 2024 da Corte Interamericana ouviu o filho de Manoel Luiz da Silva — Foto: Ruggeron Reis/Justiça Global
A Corte Interamericana de Direitos Humanos condenou o estado brasileiro pelo assassinato do trabalhador rural Manoel Luiz da Silva, que integrava o Movimento dos Sem Terra (MST) e foi morto em 19 de maio de 1997, no município de São Miguel de Taipu, na Paraíba. A leitura da sentença foi feita na tarde da terça-feira (18).
Por meio de nota, a Advocacia Geral da União (AGU) informou que o Estado brasileiro fez “o reconhecimento de sua responsabilidade internacional” e que a representação do Estado brasileiro “apresentou pedido de desculpas aos familiares de Manoel Luiz da Silva”.
Explicou também que o Estado aceitou a sua responsabilidade internacional pela violação do direito à integridade pessoal dos familiares de Manoel Luiz da Silva em virtude do sofrimento causado aos familiares com a falta de processamento célere da ação penal.
A sentença é inapelável. E condena o Brasil a indenizar os familiares de Manoel Luiz, oferecer suporte médico e psicológico adequado e garantir a reparação do caso a partir de um ato público de reconhecimento da responsabilidade do Estado brasileiro. O valor da idenização não foi divulgado, mas vai estar na íntegra da sentença, que deve ser publicado nos próximos dias pela corte internacional.
A Corte Interamericana de Direitos Humanos determinou também a implementação, no prazo de dois anos, de um sistema regional específico para a Paraíba para a coleta de dados e estatísticas relativas a casos de violência contra pessoas trabalhadoras rurais. Todas as informações deverão obrigatoriamente ser divulgadas pelo Estado, com amplo acesso à população em geral.
Além disso, a Corte determinou que o Estado brasileiro publique, no prazo de seis meses, o resumo oficial da sentença no Diário Oficial da União e no Diário Oficial do Estado da Paraíba. O documento também deverá permanecer disponível por um ano nos sites do Governo Federal, do Ministério Público e do Tribunal de Justiça do Estado da Paraíba, além de ser divulgado nas redes sociais.
A Corte entendeu que o estado brasileiro, em detrimento aos familiares da vítima, violou o direito à verdade, o direito à integridade pessoal, não garantiu o prazo razoável do processo penal e não garantiu a devida diligência ao longo do processo.
Em uma audiência realizada em fevereiro do ano passado, o Brasil reconheceu que violou direitos humanos na condução do processo e pediu desculpas oficialmente. O país também reconheceu a violação de artigos da Convenção Americana sobre Direitos Humanos, mas não reconheceu a violação do direito à verdade e sua relação com a violência aos trabalhadores e trabalhadoras rurais.
O caso foi apresentado pela Justiça Global, Comissão Pastoral da Terra (CPT) e Dignitatis. As organizações denunciaram o Brasil pela violação dos direitos às garantias judiciais, à proteção judicial e à integridade moral e psíquica dos familiares da vítima.
/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_59edd422c0c84a879bd37670ae4f538a/internal_photos/bs/2025/I/K/GEiXG9RdCCovZbFmH49g/credito-comissao-pastoral-da-terra-da-paraiba-arquivo.avif)
O caso Manoel Luiz da Silva
O crime aconteceu em 1997 em São Miguel de Taipu, Paraíba, quando o trabalhador foi baleado. A investigação aponta que os autores foram os seguranças particulares do proprietário da Fazenda Engenho Itaipu.
Na ocasião, a fazenda estava em processo de expropriação para a reforma agrária. Manoel Luiz e outros três trabalhadores sem-terra foram confrontados por seguranças enquanto atravessavam a propriedade. Os seguranças os advertiram para não entrar na área, informando que tinham ordens do proprietário para matar qualquer sem-terra encontrado ali. Após uma discussão, um dos seguranças atirou em Manoel, resultando em sua morte no local.
O processo penal foi marcado por falhas, como a demora para a realização da perícia, falta da busca pela arma do crime e a desconsideração do contexto de violência contra os trabalhadores rurais na região, violando direitos fundamentais dos familiares e das garantias judiciais, conforme informações da Justiça Global.