Entenda as regras para aprovação do acordo Mercosul e UE, e saiba quais países são contra

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O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e a presidente da Comissão Europeia, Ursula Von der Leyen, durante reunião na Cúpula do G20. Há expectativa de que Mercosul e União Europeia anunciem a finalização do acordo de livre comércio entre os dois blocos. — Foto: Ricardo Stuckert/Presidência da República

O acordo de livre comércio entre Mercosul e União Europeia foi anunciado na sexta-feira (6), por líderes do bloco sul-americano e a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen.

Apesar da expectativa pelo anúncio, que ocorre 25 anos após o início das negociações, o acordo ainda não possui nenhum efeito prático e imediato e pode demorar até ser implementado, principalmente por contas das regras para a aprovação dentro da União Europeia.

O acordo precisa passar pelo Parlamento Europeu e pelo Conselho da União Europeia, os dois principais órgãos de decisão do bloco.

▶️ O Parlamento Europeu é composto por deputados europeus, sendo o número de representantes por país proporcional ao tamanho da população. Os poderes deste órgão são legislativos, de supervisão e orçamentários.

Entre as atribuições do Parlamento está decidir sobre os acordos internacionais. Assim, para ser aprovado, o acordo precisa da maioria simples dos votos dos eurodeputados.

O processo de votação é parecido com o que ocorre no Brasil: primeiro, as propostas são encaminhadas para as comissões parlamentares, que podem propor alterações ou rejeições e preparam a legislação, e depois vão para as sessões plenárias, que aprovam ou não os projetos.

▶️O Conselho da União Europeia é composto por ministros dos governos de cada país do grupo, e é responsável por negociar medidas de legislação, coordenar as políticas dos países do bloco, definir a política externa e de segurança, além de celebrar acordos entre a União Europeia e outros países, e aprovar o orçamento.

É o Conselho que precisa ratificar o acordo para que ele tenha validade.

Para ser aprovado pelo Conselho, o acordo precisa do aval da maioria qualificada dos componentes: pelo menos 55% dos países precisam concordar, sendo que estes devem responder por, no mínimo, 65% da população total do bloco.

Para barrar o acordo, são necessários quatro países contrários, respondendo por 35% ou mais da população do grupo.

Somente assuntos sensíveis, como regras de segurança e política externa, exigem a unanimidade de cotos favoráveis para serem aprovados.

Posição dos países da União Europeia

Alguns dos países mais relevantes dentro da União Europeia já se posicionaram abertamente sobre o acordo entre o bloco e o Mercosul.

A posição mais conhecida é a da França, que lidera a oposição contra o acordo. Nesta quinta-feira (5), inclusive, o presidente Emmanuel Macron disse à Ursula von der Leyen que a França não pode aceitar o acordo em seu estado atual e o classificou como “inaceitável”, informou seu gabinete.

“O projeto de acordo UE-Mercosul é inaceitável em seu estado atual”, disse Macron à presidente da Comissão Europeia.

“Continuaremos a defender incansavelmente nossa soberania agrícola”, acrescentou a presidência francesa em uma mensagem publicada no X.

Outro país que já se declarou contra é a Polônia, que ainda garantiu que vai votar junto com Macron.

Em contrapartida, Alemanha e Espanha são abertamente favoráveis, principalmente após a eleição de Donald Trump nos Estados Unidos. O republicano prometeu taxar os produtos europeus e o acordo com o Mercosul pode representar um alívio para a economia da União Europeia.

Também regiões com bastante população em relação ao bloco, Áustria, Itália e Países Baixos não têm uma posição definida sobre o acordo, mas também sofrem com pressões do mercado interno.

Quais são os próximos passos

Após o anúncio, os próximos passos na conclusão do acordo são:

  • Revisão legal do texto;
  • Tradução do texto para a língua inglesa, para todas as 23 línguas oficiais da União Europeia e para as duas línguas oficiais do Mercosul (português e espanhol);
  • Assinatura dos líderes dos dois blocos;
  • Encaminhamento do acordo para aprovação interna dos membros dos dois grupos — e, nesta etapa, o texto precisa passar pela aprovação do Conselho da União Europeia, possivelmente a etapa mais difícil em todo o trâmite;
  • Conclusão dos trâmites de aprovação e ratificação das partes do compromisso em cumprir o acordo;
  • Só, então, o acordo entre em vigor.

Os blocos não apresentaram nenhum prazo para a conclusão de cada uma dessas etapas. O governo federal afirma que o acordo produzirá efeitos jurídicos no primeiro dia do mês seguinte à notificação da conclusão dos trâmites internos.

A aprovação interna pelos blocos segue caminhos diferentes em cada um dos blocos. No Mercosul, os parlamentos de cada um dos cinco países-membros — Brasil, Argentina, Uruguai, Paraguai e Bolívia — precisa analisar e aprovar o texto.

Já na UE, a aprovação passa pelo Conselho da União Europeia pelo Parlamento Europeu (que reúne todos os países do grupo). Essa pode ser a etapa mais desafiadora, de acordo com especialistas, porque depende do consenso da maioria qualificada do bloco. (saiba mais abaixo)

Para isso, o acordo precisa ser aprovado por, pelo menos, 55% dos países que compõem o grupo. Porém, esses 55% precisam responder por, no mínimo, 65% da população total da UE.

Há um receio de que a França, país que tem protestado contra o acordo, consiga reunir outros países com grandes populações para barrar o acordo. Para isso, basta que países que respondam por 35% da população do bloco concordem com o governo francês.

Em entrevista à GloboNews, o professor de política internacional da UERJ, Paulo Velasco, afirma que uma aprovação do acordo pela maioria obriga os países da UE a cumprirem as regras acertadas. “A soberania comercial da União Europeia é da União Europeia”, disse.

O que é o Acordo de Associação Mercosul-União Europeia?

O acordo comercial entre o Mercosul e a União Europeia tem o objetivo de reduzir ou zerar as tarifas de importação e exportação entre os dois blocos.

Estão previstos tratados em temas importantes, tais como:

  • Cooperação política;
  • Cooperação ambiental;
  • Livre-comércio entre os dois blocos;
  • Harmonização de normas sanitárias e fitossanitárias (que são voltadas para o controle de pragas e doenças);
  • Proteção dos direitos de propriedade intelectual; e
  • Abertura para compras governamentais.

As negociações começaram em 1999 e um termo preliminar foi assinado em 2019. Desde então, o texto passou por revisões e exigências adicionais, principalmente por parte da União Europeia, devido à pressão imposta principalmente por agricultores dos países-membros.

O acordo não vale apenas para produtos agrícolas, mas foi esse setor que protagonizou boa parte dos embates. Um dos receios dos produtores é de que o tratado torne os alimentos sul-americanos mais baratos na UE, reduzindo a competitividade das mercadorias europeias.

Parte dos temas já havia sido resolvida em 2019. O texto, no entanto, precisava passar por processos de validação, como a ratificação dos parlamentos de todos os países envolvidos. Foi aí que o acordo travou.

As negociações foram retomadas apenas nos últimos meses, a pedido da Comissão Europeia. A presidente da entidade, Úrsula Von der Leyen, afirma que o acordo criaria a maior parceria de comércio e investimento que o mundo já viu, beneficiando ambas as regiões e atingindo 700 milhões de pessoas.

Em entrevista coletiva de anúncio do acordo nesta sexta, a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, disse que o “acordo com Mercosul é vitória para Europa”.

“Este é um acordo ganha-ganha, que trará benefícios significativos para consumidores e empresas, de ambos os lados. Estamos focados na justiça e no benefício mútuo”, disse.

“Ouvimos as preocupações de nossos agricultores e agimos de acordo com elas. Este acordo inclui salvaguardas robustas para proteger seus meios de subsistência.”

Desafios na conclusão do acordo

Agricultores europeus, principalmente os franceses, têm se manifestado contra a aprovação do acordo. A França é um dos maiores produtores agrícolas da UE e deve ser bastante prejudicada pelo acordo, já que a América do Sul tem grandes produtores de grãos e alimentos.

Os trabalhadores alegam que haveria uma concorrência desleal, já que, segundo eles, a produção desses alimentos no bloco sul-americano não está submetida aos mesmos requisitos ambientais e sociais, nem às mesmas normas sanitárias em caso de controles defeituosos que a europeia.

Do lado sul-americano, o acordo também divide opiniões. Apesar do potencial de trazer benefícios para os países do Mercosul, a leitura de especialistas é a de que o bloco também pode sofrer com a concorrência vinda da Europa, nos setores industriais, químicos e automobilísticos.

Na quinta-feira (e em diversas outras ocasiões), o presidente francês, Emmanuel Macron, classificou o acordo como “inaceitável” em seu estado atual.

Nesta sexta-feira, a ministra do Comércio da França, Sophie Primas, reafirmou a oposição do país ao acordo comercial entre a UE e o Mercosul, afirmando que o acordo vincula apenas a Comissão Europeia, e não os Estados-membros.

A ministra se comprometeu a resistir às próximas etapas do acordo, citando “preocupações sobre os impactos ambientais e agrícolas”.

Além da França, outro país que já se manifestou contra o acordo é a Polônia. Itália também está dividida sobre o assunto.

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