Por Marcos Strecker

O ex-presidente Lula se beneficia de uma série de conjunções históricas para seu plano de voltar ao Planalto. O primeiro é o desastre do governo Bolsonaro. Além disso, o petista usa a anulação de suas sentenças por corrupção para criar a narrativa (ou seja, mentira) de que foi absolvido pelo seu envolvimento no Petrolão. Mais do que isso, conta com o recall sobre os programas lançados em seu primeiro mandato, há quase 20 anos, como o próprio Bolsa Família. A política de inclusão (que não ocorreu de fato, como apontam especialistas) se sobrepõe na memória da população à avalanche de corrupção que se seguiu nos anos petistas.

Mas, agora, Lula não poderá fazer a mesma mágica de 2002. Preparando-se para disputar a sexta eleição presidencial, ele não poderá aproveitar o programa econômico estabelecido pelo PSDB nos anos 1990, que deu estabilidade à moeda e criou o arcabouço legal que obrigou os governantes a se comprometerem com a responsabilidade fiscal. Lula voltará às propostas que o PT preconizava desde os anos 1980, como forte centralização, gastos públicos sem restrições, programas sociais populistas e leniência com a inflação. O maior indício de que essa pauta regressiva prevalecerá é a escolha da equipe que está informalmente supervisionando o programa econômico lulista: Guido Mantega e Aloizio Mercadante. Por enquanto, a nova estrela econômica do partido, Guilherme Mello, ainda não conquistou o coração de Lula (e ele não tem um pensamento muito distinto dos antigos medalhões).

É uma volta às origens. Por causa da “Carta ao Povo Brasileiro”, afiançada por Antonio Palocci em 2002, Mercadante havia sido escanteado e dado lugar no primeiro mandato de Lula a economistas “liberais”, como Henrique Meirelles e Marcos Lisboa. Agora, sente que poderá dar a volta por cima. Mantega também quer sair do ostracismo. Ele fez o segundo mandato de Lula retornar ao projeto PT-raiz e foi o grande arquiteto do desastre dilmista: a Nova Matriz Econômica e a política de campeões nacionais que levaram o País à maior recessão da história. Não se espera que Lula ressuscite o “fora FMI” ou pregue o simples calote na dívida pública, como fazia nos anos 1990, mas tudo indica que o PT retornará nos anos 2020 com a cara do passado.

Lula é pragmático e esperto, e provavelmente negociará com empresários e banqueiros o compromisso com um programa mais fiscalmente responsável em troca do apoio para voltar à Presidência. Mas dificilmente vai adotar reformas modernizantes e atacar os problemas crônicos que impedem historicamente o crescimento do Brasil, como o sistema tributário kafkiano e o Estado hipertrofiado e ineficiente. O PT não fez isso em mais de 13 anos, não se espera que fará se voltar ao poder sob a direção da velha guarda, que segue servilmente Lula. Se o centro deseja ganhar as eleições e recolocar o País no trilho do crescimento, precisará esclarecer a população sobre essa ameaça. Esse é o risco que as eleições embutem: sobre a ruína do governo Bolsonaro, é possível que o PT inaugure uma nova onda populista que conduza o País diretamente de volta ao passado.

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