“Palmeiras precisa voltar a respirar ares democráticos”, diz candidato da oposição

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Savério Orlandi é crítico da gestão "personalíssima" de Leila Pereira - Nino Andrés/Divulgação

Aclamada presidente do Palmeiras em 2021, sem nenhum adversário no pleito, Leila Pereira terá um opositor na eleição marcada para o próximo dia 24. Savério Orlandi, 53, foi o nome escolhido em uma união de diversos grupos descontentes com a gestão da empresária de 59 anos.

Ela é considerada amplamente favorita –no filtro do Conselho Deliberativo, que aprovou as candidaturas para a assembleia geral de sócios, teve 168 votos, contra 85 do rival. Mas o antagonista procura demonstrar confiança de que será vitorioso e assegura que sua investida não é uma mera demarcação de posição com os olhos na disputa de 2027.

“Nós entramos desde o início para ganhar a eleição, e a gente acredita que possa ganhar a eleição. A gente vê uma receptividade muito grande, é um movimento que está ganhando um corpo muito grande. Claro que existe uma dificuldade em relação à parcela que está sob hipnose. É um contingente enorme”, disse Savério.

Essa hipnose, segundo ele, tem a ver com os shows gratuitos promovidos no clube. Só o aluguel do ginásio, no período eleitoral, em regra bastante contestada pela oposição, custa R$ 100 mil. Haverá na próxima segunda-feira (11), sob o pretexto de celebrar o aniversário de Leila, uma apresentação da banda Jota Quest. Esteve recentemente na sede social a cantora Ivete Sangalo, e foram promovidas festas com chope à vontade.

“Qualquer cidadão comum tem que ter a condição de disputar uma eleição dentro do Palmeiras. Não pode ser só o poder econômico. O que aconteceu, na nossa visão, foi que, com o mote de dar uma aparente legalidade, uma aparente legitimidade, não foi atendido o conceito da razoabilidade. Legal, ela pode dar um show; nós, também. Mas custa R$ 100 mil o ginásio. Pô, é razoável gastar R$ 300 mil e dar um show de uma banda de rock?”, questionou Orlandi.

Sua chapa, a “Palmeiras Minha Vida É Você”, decidiu não alugar nem o ginásio nem o estande padronizado da campanha, com o valor de R$ 50 mil. Segundo o candidato, a cobrança foi mais uma demonstração do perfil da atual presidente.

“O Palmeiras precisa voltar a respirar ares democráticos. O clube foi, nos últimos anos, entrando em uma noite sombria novamente, voltando a imperar o clientelismo. Basta ver que a diretoria hoje tem mais de 140 nomes. São 44 assessores especiais da presidência! Não há nem tempo para se despachar com essas pessoas, não há matéria para despachar com 44 assessores”, disse Savério.

Nesta entrevista à Folha, o advogado condenou a gestão “personalíssima” de Leila, criticou a condução das finanças do clube e prometeu um time forte para a Copa do Mundo de Clubes, no próximo ano, no caso de ser eleito. Prometeu também que sua administração terá mais mulheres do que a atual, conduzida por uma mulher.

Por que, desta vez, a Leila terá um opositor? A oposição é composta por vários grupos, várias lideranças, e não houve uma aglutinação naquela ocasião. Desta vez, sobretudo a partir daquela entrevista dela no ano passado, quando o Palmeiras foi eliminado pelo Boca Juniors, o pessoal da oposição começou a despertar. Ela foi muito desrespeitosa.

Você se refere à ocasião em que ela disse que, quando saísse, o Palmeiras voltaria à segunda divisão? É até um contrassenso. Então, eu estaria autorizado a concluir o seguinte: “Se a senhora ficou três anos, e o seu sucessor, seja quem for, não vai conseguir dar continuidade, a senhora não preparou”. Em qualquer organização, em qualquer empresa listada na B3, que tem o CEO dela, o conselho de administração vai estar permanentemente cuidando da sucessão. Na nossa gestão, a gente pensa o Palmeiras para 5, 10, 15 anos. Quando a gente fala dessa característica personalíssima da atual gestão, é porque não está nada sendo visto para além da saída dela.

Mas a Leila não entrou no Palmeiras chutando a porta. O próprio clube e seu Conselho Deliberativo não foram abrindo as portas até entregar a ela a chave? Isso aconteceu. É uma leitura interessante. Eu, pessoalmente, sempre fui contra, mas foi estabelecida desde o começo uma relação de dependência, quase de mendicância, pelo fato de na época ser uma contratação em um valor vultoso [o patrocínio da Crefisa, à época acima do valor de mercado].

O Palmeiras aceitou essa relação de dependência e abriu o clube inteiramente para ela. Aos poucos, houve esse processo, que é um processo de cooptação. No fim do dia, não é nada mais do que isso, uma cooptação econômica. E aí você vai ampliando seu poder até chegar aonde nós chegamos hoje.

Leila Pereira diz que “é difícil ser oposição no Palmeiras” – Eduardo Knapp/Folhapress

Além do patrocinador, ela é dona do avião usado pelo clube e da empresa que controla a Arena Barueri, onde o time também joga. Há conflito de interesses? O conflito de interesses, na nossa visão, é inegável. A presidente nega peremptoriamente a existência desse conflito. Eu até entendo que seria mais salutar que ela reconhecesse a existência do conflito e, a partir desse reconhecimento, criasse estratégias e mecanismos para mitigar o conflito de interesses. Existe um instrumento primordial nesse tipo situação, em qualquer organização corporativa, que é a política de transação com partes relacionadas: o que pode e o que não pode.

Você disse que entrou na eleição para ganhar, mas, fora a questão dos shows na sede social, o Palmeiras vive fase vitoriosa no futebol e tem, na comparação com os rivais, as finanças relativamente estáveis. Dá para competir? Acho que sim. Mas, falando na questão econômica, vamos lembrar que, quando a nossa concorrente assumiu, havia uma promessa de melhora da condição econômica, e isso não aconteceu. A começar pelas receitas do clube, que ficaram estagnadas. O contrato de patrocínio não tem reajuste há três anos. E você tem questões de fluxo de caixa.

O Palmeiras tem uma dificuldade muito grande no seu dia a dia nas obrigações de curto prazo. No início do ano, ela fez uma antecipação do dinheiro do patrocínio até setembro. Com ela mesma, por coincidência… Nós não podemos concordar que um clube com a pujança de receitas como o nosso –no ano passado, faturamos R$ 840 milhões, neste ano vamos bater R$ 1 bi– tenha que se socorrer com frequência em operações bancárias de tiro curto, empréstimo de 60, 90 dias. Isso não é invenção, estão aí os balancetes.

Certo, tudo isso o incomoda. Mas o que você propõe, quais seriam os pilares da sua gestão? Em relação ao futebol, a gente entende que hoje o Palmeiras alcançou uma condição em termos de qualidade, que é uma construção. Isso não aconteceu ontem, anteontem ou no início da gestão da atual mandatária, três anos atrás. Isso é uma construção que vem de uma década praticamente, desde a inauguração do Allianz Parque, que agora completa dez anos, que nós entendemos que de fato é o elemento transformador da história recente do Palmeiras. Essa construção alcançou um lugar de excelência. A gente precisa pegar, aperfeiçoar e aprimorar.

Sobre a questão financeira, consta no nosso plano o, entre aspas, fair play financeiro interno. Temos fundamentos econômicos para eliminar ou diminuir a dificuldade de caixa e recuperar a capacidade de investimento. Isso nós temos como fazer, por meio do aumento de receita, receita que ficou represada.

E, na parte de gestão, governança. Como falei, o Palmeiras precisa voltar a respirar ares democráticos, isso é um ponto fundamental. A gente falou sobre o clientelismo, os 44 assessores especiais da presidência, e chama a atenção que não tem uma mulher. É uma questão que a gente precisa enfrentar, com metas de percentual, 20% em um primeiro momento, depois 30%, e vamos ampliando a participação das mulheres.

Então, acho que são estes pontos: governança, melhoria na condição de sustentabilidade financeira e democracia.

Falando mais especificamente sobre o elenco, apesar dos bons resultados, o time parece viver um momento de transição, há uma cobrança por ajustes no grupo. Como você vê o plantel? O Palmeiras tomou uma decisão estratégica, que já começa na gestão anterior e passa diretamente por esta gestão e pelo trabalho do nosso treinador, que é um trabalho excepcional, de esticar o elenco. O clube foi enfileirando conquistas e viu um caminho na manutenção do elenco até segunda ordem. Há jogadores que estão sob contrato no Palmeiras há muitos anos, há mais de cinco anos.

O próximo mandatário, seja eu, seja a minha adversária, vai enfrentar a questão da transição desse elenco, você não tenha dúvida. Você não vai conseguir esticar mais contratos já esticados de seis, sete, oito anos. Existem atletas que já manifestam a intenção de sair. Mas eu vejo isso mais como médio e longo prazo, para a metade, para a terceira parte da gestão.

Eu vejo um elenco vencedor, que nos trouxe alegria para burro nos últimos anos. Acho que ele pode passar por ajuste, por aprimoramento, mas, em primeiro lugar, a gente precisa entender o que o treinador acha. E sempre em decisões colegiadas, eu acredito muito nisso.

Acho que podemos aperfeiçoar um pouco. Eu, pessoalmente, acho que o elenco poderia ser ajustado com contratações para o ano que vem, com reforço, tendo em vista o campeonato que nós vamos disputar [a ampliada Copa do Mundo de Clubes]. E, depois da metade da gestão, cuidar de fazer bem a transição e concluí-la bem.

Orlandi (à dir.) foi diretor do Palmeiras de 2007 a 2010 – Diego Padgurschi – 1º.fev.07/Folhapress

Você esteve recentemente na Mancha Verde, que se envolveu em mais um episódio violento. Como viu essa situação e como seria sua relação com a organizada? Quero esclarecer que não construí relacionamento nenhum com a Mancha Verde. Fui convidado para ir lá, antes desse episódio, e sobre o episódio tenho pouco a falar, porque é reprovável por si só, é condenável, não tem mais lugar dentro do futebol e da sociedade. Felizmente, o assunto está sendo tratado como tem que ser tratado: pela polícia, pela Justiça.

Agora, com relação à questão do relacionamento, nada foi construído. Eu recebi um convite para estar lá e para conversar sobre determinadas demandas. Estive lá, não estive sozinho, estive com um dos meus candidatos a vice, com o pessoal de apoio da campanha. Não é um papo fácil, não é um papo fácil, porque é um papo com alguma hostilidade, é um papo com um tom de cobrança, mas é uma conversa que eu entendi. Estive lá porque entendi que eu jamais poderia me furtar.

Vamos lembrar que a torcida disse expressamente na reunião: “Nós não apoiamos ninguém. Fizemos uma exceção, que foi com sua concorrente, e nos arrependemos profundamente, porque a gente quebrou a cara”. Eu inclusive falei no dia: “Sempre soube que era a crônica de uma morte anunciada [o rompimento entre Mancha e Leila]”. Porque eu tinha convicção de que acabaria mal, só não sabia quando. Até me surpreendeu a velocidade.

As premissas nunca dariam certo, eram inadequadas, primeiro com promessas que jamais se concretizariam, camisa popular, ingresso popular. E houve um exagero, uma inadequação. O dirigente ir à sede da escola de samba e dar nome para a quadra de futebol da escola de samba não está certo. O dirigente dar o nome para o animal de estimação…

A relação, para responder a sua pergunta, é institucional. “Pô, Savério, é isso o que todo o mundo fala, puta lugar-comum. O que é isso?” Cara, é o seguinte: nós entendemos que você é um ator dentro do cenário. Eu fui diretor de futebol quatro anos, e nunca teve ingresso de graça para ninguém, nunca teve dinheiro para ônibus de ninguém. Agora, sempre teve diálogo, sempre teve conversa. Nas condições que nós podíamos conversar. Então, por exemplo: “Ah, quero falar com o jogador”. Não vai falar. O que você quer falar você fala conosco.

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