A indústria petrolífera da Escócia vai sendo substituída pela energia eólica

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© Distributed by The New York Times Licensing Group. Um navio se aproxima das turbinas eólicas flutuantes da Equinor, a cerca de 16 milhas da costa escocesa perto de Peterhead, 25 de agosto de 2021.

Aberdeen, Escócia – É fácil ver como o petróleo é vital para esta cidade portuária na costa nordeste da Escócia. Basta sair do pequeno aeroporto internacional para ouvir o rugido de helicópteros que transportam tripulações das – e para as – plataformas espalhadas pelo Mar do Norte.

Indo até a cidade, você vai passar por parques de escritórios com logotipos de companhias petrolíferas, lar de muitos dos 71 mil engenheiros, geólogos, perfuradores e outros na Escócia que trabalham na indústria de petróleo e gás. No geral, o setor representa cerca de sete por cento da produção econômica da Escócia.

No entanto, a indústria escocesa de petróleo e gás está em apuros. A produção de petróleo do Mar do Norte britânico está em um longo e constante declínio há duas décadas, e a produção no ano passado foi de cerca de um terço de seu pico em 1999. A produção de gás natural na região também está caindo – um problema nas últimas semanas, porque o preço do gás disparou, fazendo com que as contas de serviços públicos subissem. Os empregos ligados à indústria petrolífera em alto-mar caíram quase 40 por cento nos últimos cinco anos, de acordo com o grupo comercial Oil and Gas UK.

Turbinas eólicas flutuantes, como essas em Peterhead, Escócia, são uma oportunidade de expandir a tecnologia eólica para áreas mais profundas do oceano. (Andrew Testa / The New York Times)
© Distributed by The New York Times Licensing Group. Turbinas eólicas flutuantes, como essas em Peterhead, Escócia, são uma oportunidade de expandir a tecnologia eólica para áreas mais profundas do oceano. (Andrew Testa / The New York Times)

A indústria de petróleo e gás já foi um dos pilares da economia escocesa e fonte crucial de financiamento do governo, mas “não é mais o gerador de receita de antes”, disse Malcolm Forbes-Cable, vice-presidente da consultoria de energia Wood Mackenzie.

De fato, os custos iminentes de fechar e desmantelar milhares de poços e centenas de plataformas, recentemente estimados em 46 bilhões de libras (US$ 68 bilhões), estão começando a superar as perspectivas de lucro.

Então, em setembro, sob pressão de ambientalistas, a primeira-ministra escocesa – a principal mandatária eleita – instou o governo britânico a revisar licenças já concedidas para campos de petróleo em alto-mar ainda em fase de planejamento. A chanceler, Nicola Sturgeon, pediu ao primeiro-ministro Boris Johnson, do Reino Unido, que reavaliasse os projetos “à luz da gravidade da emergência climática que enfrentamos agora”.

A mudança abalou o setor, porque a aprovação de tais licenças não é geralmente discutida. Johnson tem a palavra final, mas os executivos do petróleo afirmam que bloquear novos campos de prospecção, efetivamente parando até 18 desenvolvimentos e grande parte dos 21 bilhões de libras em investimentos planejados nos próximos cinco anos, pode ser a morte da indústria.

O principal alvo de Sturgeon é um campo de petróleo conhecido como Cambo, a oeste das Ilhas Shetland, em águas britânicas consideradas as mais importantes em recursos promissores. A proprietária majoritária, a Siccar Point Energy, empresa privada cujos apoiadores incluem a gigante de gestão de ativos Blackstone, diz que já gastou US$ 190 milhões no campo e que criaria mil empregos diretos. Manifestantes climáticos, argumentando que ações imediatas são necessárias para enfrentar o aquecimento, fizeram do projeto Cambo seu grito de guerra. (Johnson declarou anteriormente que o governo “não pode simplesmente rasgar contratos”.)

Forbes-Cable afirmou que Sturgeon estava “caminhando na corda bamba” entre os empregos e o investimento que a Cambo produziria, e agradando ao Partido Verde Escocês, que se opõe à perfuração de petróleo no Mar do Norte, e de cujo apoio ela precisa em sua campanha para outro referendo pela independência escocesa.

A atual crise nos preços do gás natural no Reino Unido e globalmente pode fortalecer o argumento da indústria a favor da continuação do desenvolvimento. Apesar do declínio na produção do Mar do Norte, a Grã-Bretanha ainda é o segundo maior produtor de petróleo da Europa, depois da Noruega, atributo que agora pode parecer mais valioso do que há alguns meses.

Sturgeon e Johnson também querem ser vistos como combatentes das mudanças climáticas, agora que o Reino Unido se prepara para sediar uma grande conferência climática das Nações Unidas, a COP26, em Glasgow, em novembro.

Perguntas sobre o futuro da indústria de petróleo e gás na Escócia ressaltam tendências visíveis há anos. No ano passado, o investimento britânico em exploração e perfuração caiu para apenas 3,7 bilhões de libras, o menor em termos reais desde os primeiros dias de produção de petróleo em 1973, de acordo com o grupo da indústria.

Encontrar novas fontes de empregos bem remunerados será difícil, mas vital para a saúde econômica e social da Escócia, apontou Mairi Spowage, diretora do Instituto Fraser of Allander da Universidade de Strathclyde. “Não queremos repetir os erros da década de 1980”, comentou ela, quando a perda de indústria do carvão e aço na Grã-Bretanha fez com que a falta de moradia e o desemprego aumentassem.

Para muitos, o crescimento da energia renovável na Escócia, especialmente o das frotas de turbinas eólicas ao longo de sua costa, pode fornecer um caminho para substituir gradualmente o petróleo e o gás. Globalmente, as turbinas no mar ainda representam menos de um por cento da geração de energia, mas o negócio em 2020 atraiu US$ 29 bilhões em investimentos, oito por cento do total global de energia renovável, segundo Heymi Bahar, analista da Agência Internacional de Energia.

E um parque eólico piloto ao largo do porto de pesca de Peterhead, ao norte de Aberdeen, representa uma nova fronteira para esse campo.

Em vez de presas ao fundo do mar, essas turbinas flutuam, ancoradas por cabos em cima de longas estruturas verticais chamadas spars. Como flutuam, podem ser colocadas mais longe da costa, além da profundidade de aproximadamente 60 metros considerada o limite prático para a maioria das turbinas. Isso não só abre uma extensão mais ampla do oceano onde as máquinas podem ser colocadas, mas permite que elas aproveitem os ventos mais fortes e constantes geralmente encontrados longe da terra.

O parque eólico de US$ 230 milhões ao largo de Peterhead, flutuando na água a cerca de 90 metros de profundidade, supera todos os parques eólicos em alto-mar britânicos na proporção da energia que gera em relação à sua capacidade teórica – cerca de 54 por cento. A razão é o vento mais forte e mais constante. “Podemos ir para águas mais profundas, onde a velocidade do vento é mais alta. A importância do sucesso desse projeto não pode ser subestimada”, disse Ben Lawson, gerente de operações e manutenção do parque eólico, que é de propriedade majoritária e operado pela empresa norueguesa Equinor.

Aberdeen vê uma oportunidade. A cidade está gastando 350 milhões de libras em um novo porto com docas especiais projetadas para suportar o enorme peso de componentes das turbinas, além de plataformas de petróleo trazidas depois de seu desmonte. “Uma vez na vida, você tem a oportunidade de trabalhar em um novo porto”, afirmou Dave Meekham, gerente de obras, enquanto pesquisava o quebra-mar de 11 metros de altura.

O pensamento é que o projeto, a construção e a operação de estruturas flutuantes exigirão habilidades semelhantes às necessárias para construir e gerenciar plataformas em alto-mar. “Se feito de forma adequada e colaborativa entre a indústria e o governo, isso criará o próximo grande setor para a Escócia nos próximos 50 anos”, garantiu Jim McDonald, diretor e vice-chanceler da Universidade de Strathclyde e conselheiro do governo escocês para a energia.

O governo escocês também está no meio do processo de escolha de empresas para novos arrendamentos eólicos em alto-mar que podem levar a um investimento estimado em 30 bilhões de libras.

As principais gigantes petrolíferas europeias, incluindo a BP, a Total, a Equinor e a Royal Dutch Shell, estão participando. Algumas dizem claramente que uma vitória ajudará a manter a folha de pagamento em seus escritórios de Aberdeen, ameaçada pelo declínio do petróleo e do gás. A BP afirmou que, se obtiver a área que deseja, vai estabelecer Aberdeen como o centro de seu crescente negócio eólico, criando 120 empregos.

O sonho não é apenas construir parques eólicos britânicos, mas desenvolver a capacidade de fornecer equipamentos eólicos para o mundo, assim como a área de Aberdeen tem feito com a indústria petrolífera, em que é líder mundial em tecnologia submarina.

Paul de Leeuw, diretor do Instituto de Transição Energética da Universidade Robert Gordon, em Aberdeen, acredita que a indústria de energia pode acabar tendo mais empregos no fim da década. No entanto, a Escócia e o Reino Unido como um todo devem priorizar o uso de equipamentos fabricados localmente (muitos componentes para as turbinas na costa da Grã-Bretanha foram produzidos em outros lugares) e garantir que o declínio do petróleo e gás seja lento o suficiente para que as empresas continuem investindo na manutenção de empregos. “Se não fizermos essas coisas, podemos acabar tendo menos empregos do que agora.”

 

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