Bolsonaro apresentou minuta de golpe a comandantes das Forças Armadas, diz PF

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O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) ao lado do ex-ministro da Defesa e general Paulo Sérgio Nogueira - Pedro Ladeira-4.ago.22/Folhapress

Foi o próprio Jair Bolsonaro (PL), então presidente da República, quem apresentou em 2022 a minuta do golpe aos comandantes da Forças Armadas, de acordo com a Polícia Federal.

No relatório, a PF diz que o general Marcos Antonio Freire Gomes, então comandante do Exército, afirmou como testemunha que “participou de reuniões no Palácio do Alvorada após o segundo turno e que Bolsonaro apresentou hipóteses de utilização de institutos jurídicos como GLO (Garantia da Lei de Ordem), estado de defesa e estado de sítio.”

No depoimento, Freire Gomes afirmou também que foi convocado por Bolsonaro, por meio do então ministro da Defesa, general Paulo Sérgio Nogueira, a comparecer a reunião no Alvorada no dia 7 de dezembro.

Segundo ele, estavam presentes Nogueira, o comandante da Marinha, almirante Almir Garnier, e o então assessor para assuntos internacionais da Presidência, Filipe Martins.

Freire Gomes confirmou que, no encontro foi apresentado material posteriormente apreendido no celular do ajudante de ordens Mauro Cid: um decreto de estado de sítio e, ato contínuo, de uma Operação de Garantia da Lei de Ordem.

“Após a leitura do documento, Filipe Martins se retirou da sala, ficando apenas os militares e o presidente Jair Bolsonaro. Por fim, Freire Gomes relatou que o presidente Jair Bolsonaro informou que o documento estava em estudo e reportaria a evolução aos comandantes”, diz a denúncia.

A informação também aparece em depoimento do brigadeiro Baptista Júnior, então comandante da Aeronáutica. À Polícia Federal, ele disse que foi diversas vezes ao Alvorada em novembro de 2022 e que Bolsonaro, antes resignado, passou a aparentar esperança de reverter o resultado a partir do dia 14 de novembro, quando convocou os comandantes para apresentar estudo do IVL.

“O depoente ainda relatou que nas reuniões com os Comandantes das Forças e com o Ministro da Defesa, Jair Bolsonaro, apresentava a hipótese de utilização da Garantia da Lei da Ordem – GLO e outros institutos jurídicos mais complexos, como a decretação do Estado de Defesa para solucionar o que ele chamava de uma possível ‘crise institucional’”, continua o relatório.

Baptista Júnior relatou que tanto ele quanto Freire Gomes tentavam convencer Bolsonaro a não ir adiante. O comandante do Exército, segundo seu antigo par da Aeronáutica, chegou a advertir o presidente que, se ele atentasse contra o regime democrático, seria obrigado a prender Bolsonaro.

O presidente já tinha, sempre segundo a PF, o apoio do comandante da Marinha, Almir Gartnier, e do Comandante de Operações Especiais, general Estavam Theóphilo, mas carecia de apoio no alto comando do Exército. Por isso, em 14 de dezembro os comandantes do Exército e da Aeronáutica foram mais uma vez convocado, desta vez para reunião com o ministro da Defesa.

Baptista Junior relatou que, após Nogueira apresentar o decreto, perguntou se o documento previa a não assunção do cargo pelo presidente eleito (Lula).

“Paulo Sérgio (Nogueira, ministro da Defesa) ficou calado, e diante disso, (Baptista Junior) entendeu que que haveria uma ordem que impediria a posse do novo governo eleito. Em seguida, o depoente relatou que disse ao Ministro da Defesa que não admitiria sequer receber o documento e que a Aeronáutica não admitiria um golpe de Estado. Em seguida, retirou-se da sala”, diz o relatório da PF, citando depoimento de Nogueira.

“De acordo com o depoente, na reunião, o então comandante do Exército, General Freire Gomes, também expressou que não concordaria com a possibilidade de analisar o conteúdo da minuta. Já o Almirante Almir Garnier, enquanto o depoente esteve na reunião, não expressou qualquer reação contrária ao conteúdo da minuta.”

Reunião liderada por Bolsonaro

A PF confirmou a realização da reunião com outros elementos de prova. Um deles, que, naquele mesmo dia 7 de dezembro, o general Mário Fernandes, então secretário executivo da Secretaria Geral da Presidência da República, enviou mensagem para Cid dizendo que o colega estava tendo uma “reunião importante” no Alvorada e pedindo para que o ajudante de ordens exibisse um vídeo durante a reunião.

“Isso é história. E a história é marcada por momentos como esse que nós estamos vivendo agora”, disse o general que teria formulado, novamente segundo a PF, o plano “Punhal Verde Amarelo”. A mesma mensagem foi enviada ao general Walter Braga Netto, que havia sido candidato a vice na chapa de Bolsonaro, e a Sergio Rocha Cordeiro, então assessor do presidente.

Em seguida, Fernandes enviou mensagem ao general Ramos, secretário-geral da Presidência, dizendo que “dei uma cutucada em alguns generais, quatro estrelas, em nome do senhor, e tamo (sic) aqui”. Depois, avisou-o que o “decreto” havia sido despachado com Bolsonaro:: “Falei com o Renato, o decreto é real, foi despachado ontem com o presidente”

Na terça-feira (26/11), o ministro Alexandre de Moraes, do STF, decidiu derrubar o sigilo da investigação da PF sobre a trama golpista de 2022, que resultou no indiciamento do ex-presidente e de outras 36 pessoas.

Os documentos também serão enviados à PGR (Procuradoria-Geral da República), responsável por analisar as provas e decidir se denuncia ou não os investigados.

Segundo a corporação, os envolvidos cometeram três crimes: tentativa de abolição violenta do Estado democrático de Direito, tentativa de golpe de Estado e organização criminosa, cujas penas somam de 12 a 28 anos de prisão, desconsiderando os agravantes.

O lado golpista de Bolsonaro é conhecido de longa data.

Saudosista da ditadura militar (1964-1985), ele reiterou ao longo de anos sua tendência autoritária e seu desapreço pelo regime democrático. Negou a existência de ditadura no Brasil e se disse favorável a “um regime de exceção”, afirmando que “através do voto você não vai mudar nada nesse país”.

Na Presidência, deu a entender em 2021 que não poderia fazer tudo o que gostaria por causa dos pilares democráticos. “Alguns acham que eu posso fazer tudo. Se tudo tivesse que depender de mim, não seria este o regime que nós estaríamos vivendo. E apesar de tudo eu represento a democracia no Brasil.”

Durante seu mandato e após a derrota em uma acirrada disputa de segundo turno, acumulou declarações golpistas.

 

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