“Economista competente”: os acenos de Lula a Campos Neto, chefe do BC

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O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, posa para foto, na sala do COPOM na sede do Banco Central, em Brasília (DF). (Foto: Pedro Ladeira/Folhapress)

Por Fábio Matos

Eleito presidente da República pela terceira vez, Luiz Inácio Lula da Silva (PT) sabe que terá pela frente um cenário bem diferente daquele que encontrou em janeiro de 2003, quando subiu a rampa do Palácio do Planalto para suceder Fernando Henrique Cardoso (PSDB).

Vinte anos depois, a economia será um dos principais desafios do presidente eleito, a partir de 1º de janeiro. Se, há duas décadas, Lula escolheu Henrique Meirelles para comandar o Banco Central (BC) – e com ele estabeleceu uma relação considerada exemplar pelo mercado –, desta vez o petista sabe que não poderá indicar um nome para a vaga de Roberto Campos Neto, atual presidente da autoridade monetária.

Em fevereiro de 2021, o presidente Jair Bolsonaro sancionou o projeto que deu autonomia ao BC e, assim, limitou a influência do Executivo sobre as decisões relacionadas à política monetária.

Pela regra vigente desde então, os mandatos do chefe do BC e do titular do Palácio do Planalto não são mais coincidentes. O presidente do banco assumirá sempre no primeiro dia útil do terceiro ano de cada governo. Assim, o chefe do Executivo federal só poderá efetuar uma troca no comando do BC a partir do segundo ano de gestão. No caso de Lula, isso só acontecerá em 2024.

A lei ainda permite a recondução ao cargo. Com isso, em tese, o presidente do BC poderá ficar à frente da instituição por até oito anos.

Aceno do PT

Apesar de Campos Neto ter sido nomeado por Bolsonaro, emissários de Lula e o próprio presidente eleito têm feito acenos positivos ao chefe do BC. Em setembro, às vésperas do primeiro turno da eleição, o deputado federal Alexandre Padilha (PT-SP) – um dos líderes petistas com trânsito mais fluido junto ao mercado – descartou a possibilidade de o governo trabalhar pelo fim da autonomia do BC. O assunto já foi tabu nas hostes petistas, mas hoje está pacificada, no partido, a ideia de que não há condições políticas para mudar a nova regra.

Na época, Padilha foi além. Questionado sobre Campos Neto, o deputado afirmou que não havia “qualquer objeção” à sua permanência na presidência do banco. As declarações foram interpretadas como uma sinalização de que há chance de recondução de Campos Neto em 2024, embora, hoje, essa hipótese ainda não esteja sendo discutida a fundo.

Quinze dias depois de sua vitória sobre Bolsonaro no segundo turno, Lula ainda não teve uma conversa diretamente com Campos Neto, mas os contatos entre o presidente do BC e o PT já começaram. De forma discreta, é o próprio Padilha quem tem feito a aproximação. Geraldo Alckmin (PSB), vice-presidente eleito e “pau para toda obra” na coordenação da transição, também atua nesse sentido.

“Economista competente”

Ainda em setembro, Lula teceu elogios públicos a Campos Neto, a quem classificou como “economista competente” e “pessoa razoável para conversar”.

“Eu não me metia na política do Meirelles, mas vamos conversar com o presidente do Banco Central”, afirmou Lula, recordando seus dois primeiros mandatos. “O Banco Central tem como finalidade fazer com que a inflação seja controlada, e o único mecanismo que tem para isso é aumentar a taxa de juros. É preciso criar outro mecanismo”, completou.

Atualmente, a taxa básica de juros da economia brasileira (Selic) está em 13,75% ao ano. A manutenção dos juros nesse patamar é uma das formas que o BC tem de combater a escalada da inflação. Em outubro, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), a inflação oficial do país, subiu 0,59%. No acumulado do ano, chegou a 4,7%, e, em 12 meses, a 6,47%.

Segundo o relatório Focus divulgado na segunda-feira (14/11), a projeção é que a Selic termine 2022 exatamente na faixa atual (13,75%). A inflação deve fechar o ano em 5,82%.

“Precisamos trabalhar juntos”

No início deste mês, poucos dias depois do resultado do segundo turno da eleição presidencial, Campos Neto retribuiu os acenos de Lula e afirmou que sua gestão no BC trabalhará em parceria com o futuro governo.

“Muita gente está infeliz, mas a beleza da democracia é que agora a gente precisa trabalhar juntos. Temos um Banco Central independente e estamos prontos para trabalhar com o próximo governo da melhor maneira possível”, afirmou, durante participação em uma conferência em Madri. “Temos uma luta importante contra a inflação e precisamos encontrar um caminho para o país crescer de forma sustentável”, concluiu.

Indicações de Lula

Em fevereiro, logo no segundo mês de mandato, Lula indicará dois nomes para as diretorias de Fiscalização e Política Monetária do BC – hoje ocupadas por Paulo Souza e Bruno Serra Fernandes, respectivamente.

Os mandatos de ambos se encerram no dia 28 de fevereiro de 2023. Eles podem ser reconduzidos aos cargos. A decisão será de Lula.

No ano que vem, o presidente eleito poderá substituir até quatro diretores da autoridade monetária. Além de Souza e Fernandes, Maurício Moura (Relacionamento, Cidadania e Supervisão de Conduta) e Fernanda Magalhães (Assuntos Internacionais e de Gestão de Riscos Corporativos) terão seus mandatos encerrados. Em tese, eles também podem ser reconduzidos.

Os indicados de Lula precisam ser submetidos a sabatinas no Senado Federal para que tenham seus nomes aprovados. O presidente do BC e oito diretores da instituição compõem o Comitê de Política Monetária (Copom), responsável por definir a taxa básica de juros.

Em 2021, Campos Neto foi escolhido pela revista The Banker, especializada em finanças, como o melhor presidente entre os principais Bancos Centrais do mundo. Ele foi laureado em duas categorias: Global e Américas. Foi a segunda vez que um brasileiro conquistou o prêmio – a primeira havia sido em 2018, com Ilan Goldfajn.

Na terça-feira (15/11), o presidente do BC foi um dos participantes da Brazil Conference, seminário promovido pelo Grupo de Líderes Empresariais (Lide) em Nova York. Ele afirmou que o país precisa seguir o caminho da responsabilidade fiscal e avançar na agenda de reformas.

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