Famílias tentam provar que parentes morreram de câncer decorrente do 11 de Setembro
Nas semanas que se seguiram ao 11 de setembro de 2001, quando David Skiba voltava para casa após longos turnos de busca e resgate no Marco Zero, sua esposa pegava seus sapatos e os colocava do lado de fora.
“Isso são cinzas de pessoas”, afirma Matt Skiba, filho do casal, ao se lembrar do que sua mãe dizia enquanto manuseava as botas cobertas de poeira.
David Skiba, um policial do estado de Nova York de 37 anos, trabalhava em assuntos internos na cidade de Albany, na época dos ataques, mas foi rapidamente transferido para o local do World Trade Center. Lá, imerso em densas nuvens de poeira tóxica, ele ajudou a supervisionar os esforços de resgate e recuperação, de acordo com declarações assinadas por seus colegas.
Trabalhava 12 horas por dia. De setembro a novembro daquele ano, foi o membro de sua unidade mais frequentemente designado para o local. Três anos depois, David começou a se sentir doente. Em janeiro de 2005, foi diagnosticado com câncer de pulmão. Morreu em 19 de fevereiro de 2008, aos 43 anos.
Os Skibas se uniram a famílias que buscavam reconhecimento e compensação do Programa de Saúde do World Trade Center e do Fundo de Compensação das Vítimas do 11 de Setembro.
As regras do programa, porém, excluíram muitos tumores diagnosticados antes de 11 de setembro de 2005, tornando essas vítimas inelegíveis para benefícios federais.
De acordo com a política, os “cânceres sólidos” —que apresentam crescimento em órgãos— podem ser considerados associados à exposição no Marco Zero apenas se um período de latência de pelo menos quatro anos tiver transcorrido antes do diagnóstico. Eles incluem câncer de pulmão, de estômago e cerebral. Para os sanguíneos, como leucemia e linfoma, é inferior a um ano.
“O fato de o câncer dele ter sido diagnosticado oito meses antes tem nos atingido repetidamente”, disse Matt Skiba, 26. “Se você estava lá embaixo ajudando as pessoas, você deveria ser reconhecido.”
A maioria das famílias que pedem mudanças no programa recebeu benefícios do governo do estado de Nova York. Alguns tiveram os nomes de seus entes incluídos em memoriais em todo o país. Mas, para todos eles, isso continua a ser algo não resolvido do 11 de Setembro, passados 23 anos.
Famílias consideradas elegíveis para o programa recebem um pagamento único de pelo menos US$ 250 mil (R$ 1,4 milhão). Aqueles cujos parentes não se qualificam querem garantir que sejam reconhecidos pelo governo federal como vítimas do ataque e sejam honradas por seu sacrifício.
Policial aposentado e paramédico, Matthew McCauley também se juntou para ajudar no Marco Zero em 11 de Setembro e nos dias subsequentes. Ele acabara de terminar a faculdade de direito e trabalhava em um tribunal federal quando viu pela janela de seu escritório o segundo avião atingir a torre do World Trade Center. Disse que ainda consegue sentir o calor.
Hoje advogado que representa famílias de vítimas, McCauley perdeu inúmeros amigos ao longo dos anos para cânceres relacionados ao trabalho no local, incluindo seu melhor amigo, Brian Payne, um bombeiro de Westchester que morreu em 2022.
Determinar um período de latência preciso é difícil, de acordo com Lyall A. Gorenstein, especialista em câncer de pulmão no Centro Médico da Universidade de Columbia. Ele afirmou que os altos níveis de amianto detectados no Marco Zero causaram complicações de saúde e podem ser determinantes no desenvolvimento de câncer de pulmão.
Nilda Macri apelou inúmeras vezes ao Programa de Saúde do WTC para receber o reconhecimento federal de que a morte do seu marido estava ligada aos atentados, vasculhando seus registros médicos, preenchendo novos documentos e implorando aos representantes.
Seu marido, Frank Macri, era um aspirante a ator antes de se juntar ao Departamento de Polícia de Nova York. No 11 de Setembro, ambos correram para o local assim que a primeira torre foi atingida. Estavam guiando as pessoas para longe quando o segundo avião se chocou. Frank agarrou-se a um poste e se segurou enquanto a rajada de fumaça os envolvia. Ele foi atingido por tantos detritos, disse Nilda, que suas córneas foram arranhadas.
Dois anos depois, Frank sentiu dor nas costas e saiu do médico com diagnóstico de câncer de pulmão. Ele morreu em 2007, aos 51 anos.
O processo exaustivo de apelações levou Nilda a ter ataques de ansiedade, trazendo de volta memórias do 11 de Setembro e de quando seu marido lutava contra a doença. Sua mais recente apelação, disse ela, será a última. “Sinto que eles tomaram sua decisão, e acho que vão continuar a negar qualquer pessoa dentro desses quatro anos [do período de latência].”
Um porta-voz do Programa de Saúde do WTC afirmou que o projeto recentemente realizou outra revisão para verificar se há novas evidências que justifiquem uma mudança na política de latência, um procedimento padrão. Os resultados devem ser divulgados nos próximos meses.
Matt Skiba trabalhou com McCauley no caso do pai, inclusive pesquisando novos estudos que comprovem a ligação do câncer com o Marco Zero. Ele, que tinha 3 anos nos ataques e 10 quando seu pai morreu, afirma que a pior parte foi não conhecê-lo bem o suficiente.
“Gosto de fazer as pessoas rirem. Minha mãe sempre me diz que sou engraçado, mas meu pai era mais”, disse Matt. “E eu gosto quando ela diz isso, mas é meio chato, porque eu nunca realmente vi esse lado.”
Ainda assim, seu pai inspirou sua profissão. Matt se tornou engenheiro aeroespacial, projetando motores de avião, porque seu pai, um piloto amador, costumava levá-lo a shows aéreos.
“Tenho alguns grandes objetivos na vida”, disse ele. “Mas o maior deles é tentar obter o reconhecimento que acho que meu pai merece.”