Homem que submeteu mulher a estupros na França foi consumido por ‘fantasias obsessivas’, dizem psicólogos
Psiquiatras e psicólogos discorreram na segunda-feira (9) sobre o perfil do homem acusado de ter dopado a esposa ao longo de uma década, na França, para que dezenas de desconhecidos pudessem estuprá-la.
Segundo os profissionais, convocados para o sexto dia de julgamento, o principal réu do caso não tem “anomalia mental”, mas foi consumido por “fantasias obsessivas” que se aproximam da necrofilia.
Dominique Pelicot, 71, o ex-marido da vítima, é acusado de fazer a mulher ingerir ansiolíticos antes dos estupros. Os investigadores identificaram 92 abusos, que ocorreram de 2011 a 2020. Ele teria orientado outros homens, encontrados num site de relacionamento, que não a acordassem durante o ato.
Exames psiquiátricos feitos durante a investigação apontam uma mentalidade manipuladora e perversa em Dominique. “De dia, ele pode ser coerente. À noite, é diferente”, afirmou o especialista Bruno Daunizeau diante do juiz no tribunal de Avignon, no sul francês.
Antes de ter sido preso, em 2020, o acusado mantinha bom relacionamento com os netos, segundo testemunhas. Ele os ajudava com seus deveres de casa e os acompanhava em atividades esportivas. Também andava de bicicleta com vizinhos perto de sua casa na cidade de Mazan.
“Sua personalidade tem duas caras: por um lado, é um patriarca em quem as pessoas próximas podem confiar”, disse a psicóloga Marianne Douteau. Por outro, acrescentou, ele explora “as mentiras e o sigilo”.
Douteau o descreveu como um homem raivoso. Segundo a psicóloga, as características seriam semelhantes às de seu pai, a quem ele odiava. “E a sexualidade do senhor Pelicot parece calcada em sua personalidade: comum em público, mas, para sua parceira, uma sexualidade tenaz.”
O psiquiatra Paul Bensussan constatou no acusado “fantasias obsessivas”. “O voyeurismo faz parte da sua dinâmica psicossexual”, acrescentou a psicóloga Annabelle Montagne, ressaltando o seu egocentrismo e “propensão a considerar os outros como objetos manipuláveis”.
Dominique não permaneceu até o término da audiência porque teria tido dores intestinais. Jornalistas da agência de notícias AFP disseram que ele parecia fraco quando chegou ao banco de réus, apoiado em uma bengala. Ainda na segunda-feira (9), advogados do homem disseram que vão apresentar queixas por ameaças feitas nas redes sociais. O primeiro interrogatório do acusado deverá ocorrer nesta terça (10).
Além de Dominique, que pode pegar 20 anos de prisão, outros 50 homens com idades que variam de 26 a 74 anos são réus. Alguns dos acusados disseram não ter conhecimento de que o marido fazia a vítima ingerir comprimidos para dormir. Eles argumentaram que, ao cometer o crime, acreditavam estar participando de fantasias sexuais do casal. Já a vítima disse que não houve consentimento.
O caso veio à tona depois da captura de Dominique flagrado em um shopping filmando outras mulheres por baixo de suas saias no ano de 2020. Nos dias que se seguiram à prisão, os investigadores encontraram em seus computadores cerca de 4.000 fotos e vídeos de sua esposa inconsciente e sendo estuprada por dezenas de homens.
A vítima, Gisèle Pelicot, 71, disse em audiência na semana passada que seu “mundo está desabando”. Embora sua família inicialmente tivesse solicitado que seu sobrenome não fosse revelado, os advogados autorizaram a divulgação porque “mais do que nunca [seus filhos] estão orgulhosos da mãe”. Ela espera que a visibilidade do caso estimule outras mulheres a denunciar agressores.