Milei anuncia pacote ‘anticasta’, com corte de verbas a partidos e lei ficha limpa

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Javier Milei em 17 de janeiro de 2024 — Foto: Denis Balibouse/Reuters

O presidente da Argentina, Javier Milei, fez um discurso na sexta-feira (1º) na abertura das sessões ordinárias do Congresso, em que criticou a classe política e buscou justificar a política de corte de gastos que ele tem implementado.

Ele começou fazendo uma descrição dos problemas econômicos da Argentina para introduzir em sua fala as críticas aos políticos.

Milei afirmou que o Estado argentino é inoperante. Segundo ele, é “um sistema corrupto que termina com dinheiro no bolso dos políticos, uma organização criminal para que haja propina para os políticos da vez”. O presidente também afirmou que o esquema está podre está em todos os poderes, Executivo, Legislativo e Judicial, em todos níveis.

Em um recado para a oposição, ele afirmou que “aqueles que buscam conflitos” terão o que querem, apesar de a confrontação não ser o caminho que ele busca.

O presidente anunciou o fechamento da Télam, a principal agência pública de notícias da Argentina.

A casta e o pacote ‘anticasta’

Ele então criticou “empresários que querem pagar propina porque não precisam ser competitivos”, “sindicalistas que usam um regime que só beneficia a eles” e disse que se trata de “um sistema injusto, que só pode gerar pobres e produz uma casta privilegiada”.

Ele continuou a falar sobre a casta, a forma como ele se refere à classe de políticos: “Repito que um sistema que fez tanto dano é um esquema consciente, o que eu chamo de modelo da casta. A casta expropria (dinheiro) dos argentinos de bem e dá aos amigos”, disse.

Milei afirmou que chegou ao poder com o voto de “uma maioria silenciosa dos desprotegidos que não foram convidados a se sentar na mesa do poder e que colocou na presidência uma pessoa recém-chegada, sem maioria, sem governadores, mas que sabe o que precisa ser feito e tem a convicção de que deve fazer”.

Ele anunciou que vai enviar um projeto de lei “anticasta”, que incluirá os seguintes itens:

  • Fim do financiamento público dos partidos.
  • Uma espécie de “lei ficha limpa” que proíbe que pessoas condenadas em segunda instância sejam candidatas em eleições nacionais.
  • Corta os benefícios de aposentadoria dos funcionários públicos condenados em segunda instância.
  • Desconto de pagamento de funcionários públicos que participem de greves.
  • Obrigação de eleição para presidentes de sindicatos e limitação de mandato a quatro anos, com direito a uma reeleição.

No mês passado, Milei tentou aprovar um grande pacote de lei no Congresso, chamado de “lei ómnibus”, mas o texto começou a ser tão modificado que seus aliados no Legislativo acharam melhor retirar o projeto de pauta.

Além do “pacote anticasta”, ele ainda citou uma tentativa de assinar um pacto com os governadores com itens parecidos com o da “lei ómnibus”, como abertura comercial, redefinição da distribuição de dinheiro entre o governo central e as províncias e reforma trabalhista.

Ele se dirigiu aos governadores e disse que se eles “estiverem à altura das circunstâncias”, devem ir à Córdoba, em maio, para assinar esse pacto, será um sinal de que poderão trabalhar juntos e “sem rancores”.

Busca por apoio ao corte de gastos

O presidente da Argentina então falou sobre a tentativa de cortar gastos: “O déficit fiscal é a mãe de todas as batalhas”, afirmou.

Ele afirmou que a correção dos preços tabelados geraria meses de inflação alta, mas que para sanar a economia é preciso fazer sacrifícios.

“O esforço vai valer a pena porque vai poder acabar com inflação e nos permitirá acabar com o regime de apartheid político, em que os políticos são cidadãos de primeira classe, e os argentinos de bem são cidadãos de segunda classe”, disse ele.

Milei tenta se manter popular

Antes do discurso no Congresso, Milei já usou adjetivos como “ninho de ratos”, “criminosos”, “traidores”, “corruptos” e “símbolos de casta” para descrever os legisladores.

A Argentina vive um clima social tenso, marcado por greves e mobilizações e um aumento da inflação, da pobreza e da indigência.

Em uma entrevista recente ao jornal “Financial Times”, ele disse: “Não preciso do Congresso para salvar a economia” e que eles (os deputados) “precisam aceitar que as pessoas odeiam os políticos”.

O consultor e analista político Raúl Timerman afirmou que Milei é assim e continuará dessa forma. “Isso o mantém bem posicionado em termos de opinião pública”, afirmou Timerman.

Milei mantém uma imagem positiva para 50% do eleitorado, em comparação com os 55% que tinha ao assumir em 10 de dezembro.

Milei iniciou seu discurso às 21h (mesmo horário de Brasília) em vez do meio-dia, como é a tradição, para coincidir com o horário de maior audiência televisiva e em meio a um forte esquema de segurança.

Protestos do lado de fora

Organizações sociais e políticas convocaram protestos ao cair da noite.

Desde o início da nova administração, a Argentina acumulou mais de 50% de inflação e um nível de pobreza que atinge mais da metade da população.

Dez dias após sua posse, Milei emitiu um decreto presidencial (DNU) para modificar ou revogar mais de 300 normas, incluindo as leis de aluguéis, abastecimento e controles de preços.

Depois, tentou a aprovação no Congresso da “Lei Ómnibus”, com 664 artigos que buscavam mudanças estruturais, como a privatização de 41 empresas estatais, e outras normas mais curiosas, como exigir que juízes usem toga preta e um martelo. O projeto de lei não teve o sucesso que o governo esperava e o próprio Milei ordenou sua retirada.

Em resposta aos seus ajustes fiscais draconianos, as principais confederações de trabalhadores, junto com partidos políticos de oposição, realizaram uma greve nacional e várias greves setoriais.

Organizações sociais também protestam contra a suspensão do envio de alimentos pelo governo a milhares de refeitórios comunitários.

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