Bets oferecem e depois escondem apostas eleitorais; TSE diz que tema pode chegar à corte

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© Dida Sampaio/Estadão

Ao menos seis sites exploram serviço de apostas sobre as eleições municipais de 2024 e permitem a usuários arriscar dinheiro na vitória de um candidato —algo sem previsão legal específica no Brasil.

Até a última quarta-feira (11), as casas de apostas Bet365, Betano, Superbet, Parimatch, Novibet e Sportingbet permitiam apostar em quem seria o próximo prefeito de Belém, Belo Horizonte, Curitiba, Manaus, Porto Alegre, Rio de Janeiro, Salvador e São Paulo.

Na sexta-feira (13), Betano, Superbet e Sportingbet já não ofereciam mais o serviço. O cancelamento coincidiu com a publicação de reportagens sobre o tema. Esta reportagem tentou contato com as empresas, mas não obteve resposta.

Na modalidade de aposta eleitoral, as empresas oferecem prêmios diferentes conforme o candidato selecionado —são as chamadas odds (probabilidades, em inglês).

Quem usar a Bet365 para apostar em Ricardo Nunes (MDB) na corrida eleitoral da capital paulista e acertar leva R$ 1,72 para cada real apostado, por exemplo. No caso de Pablo Marçal (PRTB), são R$ 2, e com Guilherme Boulos (PSOL), R$ 5 para cada real apostado.

Em dezembro passado, o Congresso Nacional concluiu a votação do projeto de lei que regulamenta o setor de apostas de alíquota fixa, em que atuam as bets, e também a autorização para cassinos online.

A legislação autoriza dois tipos de apostas no país: aquelas que tenham por objeto disputas esportivas, como partidas de futebol, ou eventos virtuais de jogos online, como o chamado “jogo do tigrinho”. As eleitorais não estão contempladas.

A partir de 2025, só empresas autorizadas pela Secretaria de Prêmios e Apostas do Ministério da Fazenda, poderão atuar no país.

Procurada por esta reportagem para comentar a exploração de apostas eleitorais, o Ministério da Fazenda diz que “apostas que extrapolam essas duas modalidades [esportes e cassino virtual] não são previstas pela legislação, não podendo ser assim entendidas como legalizadas nem em fase de regulação ou adequação”. A secretaria, porém, não especificou se a atividade é ou não ilegal.

Questionado, o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) afirma que apostas eleitorais podem ser objeto de julgamento pela corte e que, por essa razão, não pode se pronunciar. A Justiça Eleitoral poderá se manifestar futuramente nos autos, diz.

Não existe regra legal específica que regulamente ou proíba apostas eleitorais no Brasil, dizem advogados especialistas no tema ouvidos por esta reportagem.

Membro fundador da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político, Anderson Alarcon diz não haver previsão para esse mercado na lei eleitoral, de modo que o tema não está bem resolvido. “E, quando não há lei que proíba algo, imagina-se que permitido está.”

Desde que as apostas eleitorais não se convertam em propagandas, enquetes ou pesquisas eleitorais às avessas, produzindo um incentivo enviesado e artificial no eleitor, não existe impedimento legal, argumenta o advogado.

A proibição contida na Lei de Contravenções Penais não alcança apostas eleitorais, apenas as modalidades esportivas, afirma Luiz Felipe Maia, sócio da MYLaw Advogados e especialista em regulação de jogos e apostas.

Ele nega que a falta de previsão legal caracterize uma brecha. “Brecha é o que deveria ter sido proibido e não foi”, diz. “A lei proibiu somente apostas sobre eventos esportivos e corrida de cavalo fora de local autorizado, não outros tipos.”

Maia ressalva que, a partir de 2025, a oferta de apostas eleitorais estará proibida para empresas que obtiverem a autorização da Fazenda para vir para o Brasil, porque a licença é para eventos de temática esportiva ou virtuais de jogos online.

As apostas políticas se enquadram na categoria de apostas toleradas —nem permitidas, nem proibidas— diz Fabiano Jantalia, sócio da LegisMind e especialista em direito de jogos. “A lei que regulamenta as bets e cassinos online não exclui a possibilidade de outras apostas”, argumenta o advogado. “A aposta eleitoral é legal.”

A ANJL (Associação Nacional de Jogos e Loterias), entidade que representa empresas do setor, argumenta que não há ilegalidade no oferecimento de apostas eleitorais até 1º de janeiro de 2025.

“Considerando que os resultados eleitorais são eventos reais de temática não esportiva, a ANJL entende que esse tipo de serviço não estará contemplado pela autorização federal que será concedida às casas de apostas”, diz nota enviada pela associação.

Apostas eleitorais no Brasil

  • O que diz a Lei?

    A Lei 14.790, de 2023, prevê apostas por cota fixa em duas modalidades: campeonatos esportivos e cassinos online. O texto proíbe expressamente a exploração de apostas em torneios de categoria de base ou disputados exclusivamente por menores de idade

  • O que diz o Ministério da Fazenda?

    “Apostas que extrapolam as modalidades previstas não são previstas pela legislação, não podendo ser assim entendidas como legalizadas nem em fase de regulação ou adequação”, disse a pasta em nota enviada à Folha. O Ministério não afirmou se a prática é ou não ilegal.

  • O que dizem as empresas?

    Não há ilegalidade até o dia 1º de janeiro, quando termina o processo de cadastramento de bets pelo Ministério da Fazenda e entram em vigor as autorizações concedidas pela pasta, diz a Associação Nacional de Jogos e Loterias (ANJL) em nota. A entidade também destacou que a Lei não veda explicitamente as apostas eleitorais.

  • O que diz o Tribunal Superior Eleitoral?

    A corte diz que apostas eleitorais podem ser objeto de julgamento e que, por isso, se manifestará apenas nos autos

  • O que dizem especialistas?

    Como a Lei não contém proibição expressa às apostas eleitorais, a exploração deste serviço não é ilegal, segundo advogados eleitorais e especialistas em jogos ouvidos pela reportagem

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