Exército adia compra de blindados de empresa de Israel após pedido de Múcio

Ministro da Defesa, José Múcio Monteiro tenta conseguir apoio de presidente Lula (PT) para PEC (Proposta de Emenda à Constituição) que aumenta orçamento da pasta - Pedro Ladeira/Folhapress
Por determinação do ministro da Defesa, José Múcio Monteiro, o Exército adiou a assinatura do contrato com a empresa israelense Elbit Systems de 36 viaturas blindadas de obuseiros 155 mm —espécie de canhão de grande alcance e precisão que será utilizado pela artilharia.
O contrato inicial para a entrega de um primeiro lote do equipamento militar seria assinado na terça-feira (7), às 13h30, segundo comunicado interno do Exército. A nova previsão é finalizar a compra em até 60 dias.
Múcio solicitou o adiamento na tentativa de ganhar tempo para costuras políticas, com o objetivo de aplacar resistências de petistas e de aliados do presidente Lula (PT).
A decisão coincide com o momento em que as Forças Armadas se dedicam ao enfrentamento da catástrofe no Rio Grande do Sul. Na avaliação de aliados de Lula, a compra de um equipamento bélico poderia ofuscar a ação positiva dos militares.
A aquisição de quase R$ 1 bilhão entrou na mira de políticos e apoiadores do governo devido à postura crítica que as lideranças brasileiras têm adotado contra a conduta de Tel Aviv na guerra com o grupo terrorista Hamas.
O cantor Chico Buarque, os ex-ministros José Dirceu e Paulo Sérgio Pinheiro e outros adeptos do governo petista enviaram carta a Lula pedindo que o Brasil interrompesse a importação das armas israelenses —iniciativa encabeçada pela Anistia Internacional e pelo coletivo Vozes Judaicas por Libertação.
No Exército, a justificativa para o adiamento é a necessidade de o processo licitatório passar por uma nova análise jurídica devido a alterações na reta final da contratação. A informação foi publicada pelo jornal O Estado de S. Paulo.
Generais afirmaram, sob reserva, que o objetivo é detalhar as razões pelas quais a empresa israelense venceu a licitação —evitando que eventuais questionamentos possam embarreirar a compra dos equipamentos militares.
O principal receio da cúpula militar era de o presidente Lula vetar a aquisição dos obuseiros. O governo, por razões diplomáticas, tem proibido a exportação de munições e armamentos brasileiros para a Ucrânia, país invadido pela Rússia desde fevereiro de 2022.
Lula, porém, comunicou ao ministro da Defesa que não iria criar complicações à compra dos blindados israelenses a despeito dos apelos de petistas e aliados.
O armamento israelense faz parte de um projeto chamado Atmos. O processo licitatório prevê que a empresa Elbit Systems entregará dois obuseiros como amostra nos primeiros 12 meses de contrato. Os demais 34 serão enviados em lotes anuais até o fim de 2034.
A Elbit Systems superou empresas de França, China e Eslováquia na reta final da disputa. Militares afirmaram ao jornal Folha de SP, sob anonimato, que um dos principais diferenciais da empresa israelense é possuir subsidiárias no Brasil com capacidade de fabricar a munição de 155 mm e garantir suporte logístico.
As fábricas brasileiras são as empresas Ares Aeroespacial e Defesa e AEL Sistema, com sedes no Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul, respectivamente. A contratação da empresa de Israel, portanto, seria uma forma de aquecer a base industrial de defesa brasileira.
Em nota, a Elbit Systems afirmou que a montagem final dos obuseiros será feita no Brasil. “Aproveitando as estruturas de logística e produção implementadas pelo grupo e em colaboração com alguns potenciais parceiros nacionais a serem definidos em conjunto com o Exército Brasileiro”, disse.
A empresa não quis comentar o adiamento da assinatura do contrato. Procurado, o Exército não se manifestou.
O presidente Lula tem adotado posição crítica à ofensiva israelense na Faixa de Gaza, que envolve operações em hospitais e bombardeios em regiões populosas. O número de mortos no território palestino beira os 35 mil, segundo o Ministério da Saúde local, controlado pelo Hamas.
Em viagem a Adis Abeba, na Etiópia, Lula chegou a comparar as ações militares de Israel com o extermínio de judeus promovido por Adolf Hitler. “Sabe, o que está acontecendo na Faixa de Gaza com o povo palestino, não existe em nenhum outro momento histórico. Aliás, existiu quando Hitler resolveu matar os judeus”, afirmou em fevereiro.
A declaração do presidente gerou reação do governo de Binyamin Netanyahu, que declarou o líder brasileiro “persona non grata”. “Não esqueceremos nem perdoaremos”, disse à época o chanceler do país, Israel Katz. “Em meu nome e em nome dos cidadãos de Israel, diga ao presidente Lula que ele é persona non grata em Israel até que retire o que disse.”
Mesmo diante de repercussões negativas e impacto diplomático, Lula não se retratou e, cinco dias após a declaração, voltou a falar que Israel estava cometendo um genocídio contra o povo palestino. “O que o governo de Israel está fazendo com a Palestina não é guerra, é genocídio”, disse Lula, que enfatizou: “Se isso não é genocídio, eu não sei o que é.”