Há 20 anos no poder, Tayyip Erdogan é reeleito presidente da Turquia

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Recep Tayyip Erdogan, presidente da Turquia. © Reuters/FLORION GOGA

O presidente da Turquia, Recep Tayyip Erdogan, de 69 anos, foi reeleito para seu terceiro mandato no domingo (28), após uma corrida eleitoral acirrada no segundo turno contra o líder da oposição, Kemal Kilicdaroglu.

Erdogan recebeu 27.513.587 votos (ou 52,14%), segundo dados divulgados pelo Conselho Superior Eleitoral da Turquia, superando o adversário Kilicdaroglu, que obteve 25.260.109 votos (ou 47,86%), com mais de 99% das urnas apuradas.

Erdogan declarou vitória pouco antes de o Conselho Superior Eleitoral, responsável pela contagem dos votos, oficializar o término da apuração. A eleição presidencial foi inédita: pela primeira vez a disputa foi para um segundo turno.

Com o feito, Erdogan, que está há 20 anos no poder, terá direito a um mandato de mais cinco anos no comando da Turquia.

“Agora é a hora de proteger a vontade das pessoas que temos na mais alta estima”, escreveu Erdogan em sua conta no Twitter.

Erdogan enfrentou Kilicdaroglu, de 74 anos e líder do partido de esquerda CHP. Segundo colocado, Kilicdaroglu admitiu a derrota e disse que continuará a liderar sua luta após “a eleição mais injusta em anos” contra o atual presidente.

“Tenho um pedido de todos vocês, por favor, vamos manter viva a luta pela democracia para vocês, para seus filhos, para os aposentados, para nossas mães e pais, para nossos agricultores e comerciantes”, disse.

Kemal Kilicdaroglu, líder do Partido Republicano do Povo (CHP) e candidato derrotado à Presidência da Turquia / Anaodlu Agency/Getty Images

“Vivemos a eleição mais injusta dos últimos anos. Todos os meios do Estado foram mobilizados para um partido político. Todas as possibilidades foram colocadas sob os pés de um homem”, acrescentou.

Falando em Ancara, Kilicdaroglu disse que os resultados mostraram a vontade do povo de mudar um governo autoritário.

“Nesta eleição, a vontade do povo de mudar um regime autoritário surgiu apesar de todas as pressões. Continuaremos nossa luta em todas as frentes com todos os membros do Partido Republicano do Povo (CHP) e da Aliança Nacional. Continuaremos sendo na vanguarda desta luta até que a verdadeira democracia chegue ao nosso país.”

Ele afirmou ainda que está triste com os “problemas” que aguardam a Turquia.

O terceiro colocado no primeiro turno, Sinan Ogan, havia anunciado no último dia 22 apoio a Recep Tayyip Erdogan. Ogan havia recebido 5,17% dos votos no primeiro turno, ante 49,52% de Erdogan na primeira rodada do pleito presidencial.

Apoio de Putin e mensagem de Zelensky

O presidente russo, Vladimir Putin, parabenizou hoje seu “querido amigo” Tayyip Erdogan, antes mesmo do anúncio oficial do resultado.

“A vitória eleitoral foi um resultado natural de seu trabalho altruísta como chefe da República da Turquia, uma clara evidência do apoio do povo turco aos seus esforços para fortalecer a soberania do Estado e conduzir uma política externa independente”, disse Putin em uma mensagem a Erdogan, segundo o Kremlin.

Em entrevista à CNN antes do segundo turno das eleições presidenciais, Erdogan disse ter um relacionamento “especial” e crescente com Putin.

“Não estamos em um ponto em que imporíamos sanções à Rússia como o Ocidente fez. Não estamos sujeitos às sanções do Ocidente”, disse Erdogan. “Somos um Estado forte e temos uma relação positiva com a Rússia.”

“Rússia e Turquia precisam um do outro em todos os campos possíveis”, acrescentou.

Embora a Turquia seja uma aliada da Otan, Erdogan muitas vezes frustrou Washington – por exemplo, ao se aproximar da Rússia e sugerir uma reaproximação com a Síria.

O presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, se manifestou neste domingo (28) pelas redes sociais: “Contamos com o fortalecimento da parceria estratégica para o benefício de nossos países, bem como o fortalecimento da cooperação para a segurança e estabilidade da Europa”. Erdogan tem procurado atuar como intermediário entre Kiev e Moscou desde que a Rússia invadiu a Ucrânia no ano passado.

Terremoto e estratégias eleitorais

A reeleição de Erdogan ocorreu quase quatro meses depois que um terremoto, ocorrido em 6 de fevereiro, matou mais de 50.000 pessoas e deslocou mais de 5,9 milhões no Sul da Turquia e no Norte da Síria.

Também ocorreu em meio a uma grave crise econômica e o que os analistas dizem ser uma erosão democrática sob o governo de Erdogan.

Mesmo antes do desastre de fevereiro, a Turquia lutava contra o aumento dos preços e uma crise cambial que em outubro viu a inflação atingir 85%, o que afetou o poder de compra da população.

Os críticos de Erdogan argumentam que ele galvanizou ainda mais sua base de apoio ao fazer alegações sem fundamento no campo da oposição. Ele acusou Kilicdaroglu de conluio com grupos terroristas curdos e repetidamente se referiu ao líder da oposição – um membro da minoria muçulmana liberal Alevi – como um muçulmano não bom o suficiente.

“Essa estratégia de ‘não bons muçulmanos e apoiada por terroristas’ atraiu os eleitores de direita que deveriam escolher Kilicdaroglu”, disse Soner Cagaptay, membro sênior do Washington Institute for Near East Policy.

Cagaptay argumenta que, embora a mensagem de Erdogan não tenha ressoado nas grandes cidades da Turquia e na relativamente rica costa Sul, que votaram amplamente na oposição, ela conquistou o apoio necessário das partes mais pobres do país, principalmente nas regiões centrais e na costa do Mar Negro.

“Lá, o apoio a Kilicdaroglu foi suprimido porque os eleitores de direita cujos próprios partidos apoiavam Kilicdaroglu não o escolheram”, disse ele.

As mensagens de Erdogan também foram amplificadas por seu amplo domínio sobre a mídia turca, argumentaram os analistas.

Participação dos eleitores

Erdogan liderou a campanha eleitoral. No primeiro turno, em 14 de maio, o atual presidente garantiu uma vantagem de quase cinco pontos sobre Kilicdaroglu, mas ficou aquém do limite de 50% necessário para vencer.

O bloco parlamentar do presidente conquistou a maioria das cadeiras na corrida parlamentar no mesmo dia.

Erdogan votou em um centro de votação em Istambul no domingo. “Esta é a primeira vez na história democrática turca”, disse ele.

“A Turquia, com quase 90% de participação na última rodada, mostrou lindamente sua luta democrática e acredito que fará o mesmo novamente hoje”, acrescentou.

Recep Tayyip Erdogan nasceu em 26 de fevereiro de 1954, em Istambul, na Turquia. Ele é casado e tem dois filhos e duas filhas.

Se formou em 1981 na Faculdade de Ciências Econômicas e Administrativas da Universidade de Mármara. Antes de sua carreira política, Erdogan era um jogador semi-profissional de futebol.

Ele foi duramente criticado por não proteger os direitos humanos e das mulheres, restringindo a liberdade de expressão e tentando restringir a identidade secular da Turquia.

Sob Erdogan e o Partido da Justiça e Desenvolvimento (AKP), o país suspendeu as restrições à expressão pública da religião, incluindo o fim da proibição de mulheres usarem lenços de cabeça de estilo islâmico.

Ele chegou ao poder em 2003, como primeiro-ministro, e se tornou o presidente em 2014, ampliando os poderes do cargo a partir de uma reforma constitucional três anos depois. Ele foi reeleito em 2018.

Erdogan prometeu continuar com cortes de taxas de juros para reduzir a alta inflação caso seja eleito. Em entrevista à CNN, pontuou ainda que isso significa que não mudará a política econômica.

Como funcionam as eleições na Turquia

As eleições para presidente e para o Parlamento na Turquia acontecem simultaneamente a cada cinco anos.

Os partidos podem indicar candidatos à Presidência se tiverem ultrapassado a marca de 5% dos votos nas últimas eleições parlamentares ou caso tenham 100 mil assinaturas apoiando uma nomeação.

O candidato que tiver mais de 50% dos votos no primeiro turno será eleito. Se isso não ocorrer, há segundo turno entre os dois nomes mais bem votados.

Já no caso do Parlamento, o país segue o sistema de representação proporcional, sendo que o número de assentos que um partido obtém — do total de 600 cadeiras — é diretamente proporcional aos votos que ganha.

Entretanto, os partidos precisam conseguir pelo menos 7% dos votos — sozinhos ou em “aliança” — para poder colocar representantes no Congresso.

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