Governo faz tributação indireta de dividendo e pode alcançar aplicação isenta; entenda
As medidas de compensação à correção da tabela do IRPF (Imposto de Renda da Pessoa Física) para R$ 5.000 a partir de 2026 representam uma tributação indireta da distribuição de lucros e dividendos e de investimentos isentos, além de elevar o imposto sobre outras rendas financeiras.
Esse efeito está limitado, no entanto, aos contribuintes com renda a partir de R$ 50 mil por mês (R$ 600 mil por ano) e terá efeitos positivos sobre a distribuição de renda.
O governo ainda não divulgou a nova tabela do IRPF nem os detalhes da tributação mínima sobre a renda no Brasil. Ainda há dúvidas se serão alcançadas, por exemplo, as rendas de verbas indenizatórias trabalhistas e a caderneta de poupança.
Mas a expectativa é que a combinação de isenção e imposto mínimo resulte em melhora no índice de Gini, uma forma de medir a desigualdade.
Pesquisa conduzida pelo economista Ricardo Carvalho Gonçalves, como parte do Projeto Transforma, da Unicamp (Universidade de Campinas), mostra que a simples correção da faixa de isenção da tabela para R$ 5.000 teria efeitos negativos sobre a distribuição, pois beneficiaria também as pessoas de maior renda. Por isso, é importante a tributação adicional sobre altas rendas, incluindo rendimentos isentos, e o limite de efeitos até R$ 7.500.
“Uma tributação adicional acima dos R$ 50 mil vai ter um impacto distributivo importante. Você está conseguindo tributar lucros e dividendos de forma indireta. [Essa isenção] é uma anomalia brasileira. As pessoas mais ricas do país recebem os rendimentos através desse mecanismo e não pagam Imposto de Renda”, afirma o economista.
No Brasil, os lucros corporativos são tributados de acordo com o porte da empresa, mas sua distribuição é isenta. Com isso, a tributação de um pequeno investidor que possui ações da Petrobras pode ser superior a de um milionário dono de empresas do Simples Nacional, quando se considera a soma do imposto na pessoa física e jurídica. Os chamados milionários do Simples pagam, em média, apenas 7,4% de imposto sobre tudo o que ganham.
De acordo com estudo do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), as empresas dos regimes do lucro presumido e Simples Nacional representam cerca de um terço dos lucros gerados pelas companhias brasileiras, mas respondem por 70% dos valores distribuídos às pessoas físicas que fazem a declaração do Imposto de Renda.
Devido a uma série de benefícios fiscais e regimes especiais, as empresas do Simples Nacional (faturamento até R$ 4,8 milhões/ano) têm uma tributação média efetiva de 6,4% sobre seus lucros; as do Lucro Presumido, de 11%. Para as grandes empresas do lucro real (faturamento acima de R$ 78 milhões/ano), ela é de 22,4%, percentual que sobe para 30,7% para as instituições financeiras —apesar de a alíquota nominal ser de 34%.
Ana Carolina Monguilod, professora do Insper e sócia no CSMV Advogados, afirma que a tributação indireta dos dividendos evita que o governo tenha de discutir mudanças nos tributos sobre o lucro das empresas, como ocorreu nos debates sobre o tema no governo anterior.
“O que está se pretendendo fazer agora, com essa tributação das grandes receitas de pessoas físicas, que auferem ganhos de mais de R$ 50 mil por mês, é, por vias oblíquas, tributar os dividendos sem reduzir o IRPJ e a CSLL”, afirma a professora do Insper.
Ela diz que essa tributação adicional deve pegar investimentos hoje isentos, como as letras de crédito e os certificados de recebíveis dos setores imobiliário e agro (conhecidas pelas siglas LCI, LCA, CRA e CRI).
“Eles são isentos por determinados motivos, e essas isenções deveriam ser revistas individualmente, e não por uma tributação oblíqua de 10% que aparentemente não vai discernir que tipo de renda está sendo auferida. É uma sinalização muito ruim para o mercado e para o investidor.”